31 março 2021

O Papa: neste Calvário de morte, Jesus sofre nos seus discípulos

 

  Papa Francisco na Audiência Geral 
 

Mariangela Jaguraba - Vatican News

"O Tríduo Pascal" foi o tema da catequese do Papa Francisco na Audiência Geral desta quarta-feira, realizada na Biblioteca do Palácio Apostólico.

"Já imersos na atmosfera espiritual da Semana Santa, estamos na vigília do Tríduo pascal. De amanhã até domingo viveremos os dias centrais do Ano" litúrgico, celebrando o mistério da Paixão, Morte e Ressurreição do Senhor. Vivemos este mistério todas as vezes que celebramos a Eucaristia. Quando vamos à missa, vamos não apenas para rezar, mas para renovar este mistério. É como se fossemos ao Calvário para renovar o mistério pascal", disse o Pontífice no início da sua catequese.

A seguir, o Papa recordou que "na noite de Quinta-feira Santa, ao entrarmo-nos no Tríduo pascal, reviveremos na Missa in Coena Domini o que aconteceu na Última Ceia. É a noite em que Cristo entregou aos seus discípulos o testamento do seu amor na Eucaristia, não como uma lembrança, mas como um memorial, como a sua presença perene. É a noite em que Ele nos pede para nos amarmos uns aos outros, tornando-nos servos uns dos outros, como fez ao lavar os pés dos discípulos. É um gesto que antecipa a cruenta oblação na cruz".

"A Sexta-feira Santa é um dia de penitência, jejum e oração", recordou o Papa. "Através dos textos da Sagrada Escritura e das orações litúrgicas, estaremos como que reunidos no Calvário para celebrar a Paixão e a Morte Redentora de Jesus Cristo. Teremos na mente e no coração o sofrimento dos doentes, dos pobres, dos descartados deste mundo; recordaremos os “cordeiros imolados”, vítimas inocentes de guerras, ditaduras, violência diária, abortos. Levaremos diante da imagem do Deus crucificado, em oração, os muitos, demasiados crucificados de hoje, que só d'Ele podem receber o conforto e o significado do seu sofrimento. Hoje, existem muitos! Não se esqueçam dos crucificados de hoje que São a imagem do crucificado, Jesus. Neles está Jesus", disse ainda Francisco, acrescentando:

Desde que Jesus tomou sobre si as chagas da humanidade e da própria morte, o amor de Deus irrigou estes nossos desertos, iluminou estas nossas trevas. Porque o mundo está nas trevas! Recordemos todas as guerras em andamento neste momento. De todas as muitas crianças que morrem de fome, das crianças que não têm escola, de povos inteiros destruídos pela guerra, pelo terrorismo, de muitas pessoas que para se sentirem melhor precisam da droga, da indústria da droga que mata, mas é uma calamidade! É um deserto! Existem pequenas ilhas do povo de Deus, tanto cristão como de qualquer outra fé, que guardam no coração o desejo de serem melhores. Mas, vejamos a realidade: neste Calvário de morte, é Jesus que sofre nos seus discípulos.

A seguir, o Papa recordou que "o Sábado Santo é o dia do silêncio: há um grande silêncio em toda a Terra; um silêncio, vivido no pranto e na perplexidade pelos primeiros discípulos, perturbados com a morte ignominiosa de Jesus. Enquanto o Verbo está em silêncio, enquanto a Vida está no túmulo, aqueles que tinham esperança n'Ele são postos à prova, sentem-se órfãos, talvez até órfãos de Deus. Este sábado é inclusive o dia de Maria: também ela o vive em lágrimas, mas o seu coração está cheio de fé, cheio de esperança, cheio de amor".

"Na escuridão do Sábado santo, irromperão a alegria e a luz com os ritos da Vigília pascal e o canto jubiloso do Aleluia", frisou o Papa. "Será um encontro de fé com o Cristo ressuscitado, e a alegria pascal continuará ao longo dos cinquenta dias que se seguirão. Aquele que foi crucificado, ressuscitou! O Ressuscitado dá-nos a certeza de que o bem triunfa sempre sobre o mal, que a vida vence sempre a morte. O Ressuscitado é a confirmação de que Jesus tem razão em tudo: em prometer-nos vida para além da morte e perdão para além dos pecados. Os discípulos duvidaram, não acreditaram. A primeira a crer e a ver foi Maria Madalena, ela foi a apóstola da ressurreição. Ela foi contar que Jesus a tinha visto, que a tinha chamado pelo nome. E então, todos os discípulos viram." A seguir, o Papa disse:

Mas, eu gostaria de me deter nisto: os guardas, os soldados, que estavam no sepulcro para não deixar que os discípulos viessem e levassem o corpo, o viram: eles o viram vivo e ressuscitado. Os inimigos o viram, mas fingiram que não o tinham visto. Porquê? Porque foram pagos. Eis o mistério, eis o verdadeiro mistério do que Jesus disse uma vez: “Há dois senhores no mundo, dois, não mais que dois: Deus e o dinheiro. Quem serve ao dinheiro é contra Deus”. Aqui foi o dinheiro que mudou a realidade. Eles viram a maravilha da ressurreição, mas foram pagos para ficar em silêncio.

Francisco convidou a pensar "nas muitas vezes que homens e mulheres cristãos foram pagos por não reconhecerem na prática a ressurreição de Cristo e não fazem o que Cristo nos pediu para fazer, como cristãos". O Papa concluiu a sua catequese com as seguintes palavras:

Estimados irmãos e irmãs, também este ano viveremos as celebrações da Páscoa no contexto da pandemia. Em tantas situações de sofrimento, especialmente quando quem as padece são indivíduos, famílias e povos já provados pela pobreza, calamidade ou conflito, a Cruz de Cristo é como um farol que aponta o porto para os navios ainda a flutuar num mar tempestuoso. A Cruz de Cristo é o sinal de esperança que não desilude; e nos diz que nem uma lágrima, nem sequer um gemido, são perdidos no desígnio de salvação de Deus. Peçamos ao Senhor que nos dê a graça de servir, de reconhecer esse Senhor e de não nos deixar pagar para esquecê-lo.

VN

30 março 2021

Papa: um modelo de desenvolvimento que escute o grito de pobres e indígenas

 
Pontífice convida a escutar as vozes dos indígenas, "intérpretes do grito da terra e dos pobres"  (AFP or licensors) 
 
 
Francisco, numa mensagem em espanhol ao Fórum da Unesco sobre a Biodiversidade, promovido em março, recorda a necessidade de agir em conjunto para uma profunda revisão do atual modelo de desenvolvimento. O aquecimento global e o seu impacto sobre os pobres exige uma resposta, afirma o Pontífice, que assuma a fragilidade da Casa Comum. O Papa recomenda escutar não somente os especialistas, mas também as comunidades locais e os povos indígenas, "atores não estatais, muitas vezes na linha de frente na luta contra a mudança climática".
 

Benedetta Capelli - Vatican News

Escutar as vozes como aquelas dos povos indígenas – que são "intérpretes do grito da terra e dos pobres", investir na educação dos jovens para que abracem novos estilos de vida e fortalecer os processos que combatam o fenómeno da mudança climática. Estas são as indicações do Papa Francisco junto a um fórum sobre biodiversidade da Unesco, a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, que teve como tema: "O Nosso planeta, o nosso futuro: 50 anos do programa sobre o homem e a biosfera", que foi promovido em modalidade on-line no último dia 24 de março. A iniciativa foi realizada tendo em vista a Conferência de Kunming, programada na cidade chinesa para o período de 17 a 30 de maio. 

Na oportunidade, o Observador Permanente da Santa Sé junto à Unesco, mons. Francesco Follo, leu a mensagem que o Papa Bergoglio tinha enviado à diretora geral da organização, Audrey Azoulay, por ocasião de uma reunião anterior realizada em 27 de outubro de 2020, que - como explicou o prelado - destaca a contribuição do Pontífice para uma ecologia integral destinada a preservar a Casa Comum. No texto, o Pontífice expressa "gratidão" porque "um dos problemas mais importantes e urgentes do nosso tempo" está a ser discutido.

Um novo modelo de desenvolvimento

Francisco enfatiza como "a luta contra a mudança climática e a luta contra a pobreza extrema" são interdependentes e, por isso, é necessário redefinir um novo modelo de desenvolvimento, "adotando uma metodologia que integre a ética da solidariedade e da caridade política".

“Somente assim será possível promover um bem comum verdadeiramente universal, uma verdadeira civilização do amor onde não há lugar para uma pandemia de indiferença e desperdício.”

No coração do Papa estão os pobres, que mais do que outros sofrem com o impacto da mudança climática, e é por isso que "a resposta à atual crise socioambiental" deve ser vista "como uma oportunidade única para assumir a responsabilidade pela fragilidade da nossa Casa Comum, melhorando as condições de vida, a saúde, os transportes, segurança energética e criando novas oportunidades de emprego".

Os jovens, a chave para a mudança

Recordando o Acordo de Paris, Francisco enfatiza que há uma crescente consciência de que a mudança climática é "uma questão muito mais moral do que técnica". Daí a necessidade de uma "virsagem decisiva" possível somente investindo "na educação das novas gerações para estilos de vida que respeitem a Criação, até agora inexplorados". Ao educá-los na salvaguarda da Criação, no respeito pelos outros, em novos hábitos de produção e consumo, eles serão os protagonistas de "um novo modelo de crescimento económico que coloca o meio ambiente e as pessoas no centro".

Agir em conjunto

"Se queremos combater efetivamente a mudança climática”, escreve ainda o Papa, "devemos agir juntos, levando em conta a necessidade de implementar uma profunda revisão do atual modelo de desenvolvimento, a fim de corrigir as suas anomalias e distorções".

“Dar respostas concretas ao grave fenómeno do aquecimento global é um imperativo moral. A falta de ação terá efeitos secundários, especialmente entre os estratos mais pobres da sociedade, que também são os mais vulneráveis a essas mudanças.”

Intérpretes do grito da terra

Assim, Francisco recomenda escutar não somente os especialistas, mas também as comunidades locais e os povos indígenas, "atores não estatais, muitas vezes na linha da frente na luta contra a mudança climática", que "demonstram uma particular sensibilidade na procura de formas inovadoras para promover um sistema sustentável de produção e consumo e, assim, se tornam intérpretes do grito da terra e dos pobres".

O tempo está a esgotar-se para a procura de soluções globais e a emergência sanitária atual obriga-nos a "pensar nos seres humanos, em todos, e não nos lucros de poucos". Somente desta forma, conclui o Papa, será possível promover "o verdadeiro desenvolvimento humano integral".

 

NOTA: Se utilizar o seu TELEMÓVEL e não conseguir aceder ao VIDEO contido nesta página, siga as instruções indicadas AQUI

 VN

Deslocados pela crise climática. Papa: “Ver ou não ver, eis a questão!"

 
 Deslocados latino-americanos 
 
 
Prefácio do Papa Francisco ao livro “Orientações Pastorais sobre as Pessoas Deslocadas pela Crise Climática" organizado pela Seção Migrantes e Refugiados do Dicastério para o Serviço do Desenvolvimento Humano Integral. A conferência de apresentação foi realizada na Sala de Imprensa da Santa Sé com a presença do cardeal Czerny Subsecretário da Seção Migrantes e Refugiados do Dicastério

 

Jane Nogara - Vatican News

Na manhã desta terça-feira (30) foi realizada uma colnferência de imprensa para a apresentação do livro “Orientações Pastorais sobre as Pessoas Deslocadas pela Crise Climática” organizada pela Secção Migrantes e Refugiados do Dicastério para o Serviço do Desenvolvimento Humano Integral. A obra tem o prefácio do Papa Francisco. A coletiva contou com a presença do cardeal Michael Czerny S.I, Subsecretário da Seçção Migrantes e Refugiados, e do padre Fabio Baggio, C.S. também Subsecretário da mesma secção.

Ver ou não ver, eis a questão!

O prefácio do livro escrito pelo Papa Francisco, apresenta a obra como “um guia repleto de factos, interpretações políticas e propostas relevantes …mas, - continua o Papa - desde logo, sugiro que adaptemos o famoso “ser ou não ser” de Hamlet e afirmemos: ‘Ver ou não ver, eis a questão!Tudo começa com a capacidade de ver de cada um, sim, a minha e a vossa”. Francisco destaca a nossa indiferença: “Somos submersos por notícias e imagens de povos inteiros desenraizados devido a cataclismos climáticos e forçados a migrar. Mas o efeito que estas histórias produzem em nós e a nossa resposta (...) dependem da nossa capacidade de ver o sofrimento contido em cada história.

Não é algo inevitável

“O facto de as pessoas se deslocarem porque o seu habitat local tornou-se inabitável, pode parecer um processo natural, algo inevitável. No entanto, a deterioração climática resulta muito frequentemente de escolhas erradas e atividade destrutiva, egoísmo e negligência que colocam a humanidade em conflito com a criação, a nossa casa comum”. O Pontífice pondera que a pandemia, “nos atingiu sem aviso” enquanto a crise climática “manifesta-se desde a Revolução Industrial” e não atinge de modo uniforme mas o maior efeito é sentido pelos que menos contribuíram para elas”.

Números crescentes de deslocados

O Papa alerta ainda que “números impressionantes e crescentes de deslocados pela crise climática estão rapidamente a tornar-se uma emergência grave do nosso tempo”. “Forçadas a abandonar campos e zonas costeiras, casas e aldeias, as pessoas fogem à pressa, levando consigo apenas algumas lembranças e tesouros, fragmentos da sua cultura e património. Partem com a esperança de recomeçar as suas vidas num local seguro. Mas na maioria dos casos acabam em favelas perigosamente sobrepovoadas ou em alojamentos precários, à mercê do destino”.

Apelo do Papa

“As pessoas expulsas dos seus lares pela crise climática necessitam de ser acolhidas, protegidas, promovidas e integradas. Elas querem recomeçar. Para criar um novo futuro para os seus filhos, precisam ter condições e ser ajudadas. Acolher, proteger, promover e integrar são verbos que implicam uma ação útil. Retiremos, uma a uma, as barreiras que bloqueiam o caminho dos deslocados, o que os reprime e marginaliza, os impede de trabalhar e ir à escola, tudo o que os torna invisíveis e nega a sua dignidade”.

Não podemos regressar e não podemos começar de novo

Francisco recorda que as “Orientações Pastorais sobre as Pessoas Deslocadas pela Crise Climática exigem um novo olhar sobre este drama do nosso tempo”. ‘Não podemos regressar e não podemos começar de novo’. Convidam-nos a tomar consciência da indiferença das sociedades e governos para com esta tragédia. Pedem-nos para ver e cuidar. Convidam a Igreja e outros participantes a agir em conjunto e especificam o modo de o fazer”.

Por fim o Pontífice afirma que “Não vamos superar crises como as alterações climáticas ou a COVID-19 refugiando-nos no individualismo, mas apenas com o esforço de “muitos em conjunto”, através do encontro, do diálogo e da cooperação”. Enche-me assim de grande alegria o facto de estas Orientações Pastorais sobre as Pessoas Deslocadas pela Crise Climática terem sido elaboradas sob a égide do Dicastério para o Serviço do Desenvolvimento Humano Integral, juntamente pela Secção Migrantes e Refugiados e pelo Setor de Ecologia Integral. Esta colaboração é, em si mesma, um sinal do caminho a seguir. Ver ou não ver é a questão que nos conduz à resposta numa ação conjunta. Estas páginas mostram-nos o que é preciso e, com a ajuda de Deus, o que fazer”.

VN

29 março 2021

Francisco: os sacerdotes devem ter um olhar de ternura, reconciliação e fraternidade

 
 O sacerdote deve deixar-se moldar pelo Bom Pastor 

 
O Papa ressaltou à comunidade do Pontifício Colégio Mexicano de Roma que os problemas atuais exigem dos sacerdotes a necessidade de se configurarem ao Senhor e ao olhar de amor com que Ele nos contempla. "Ao conformar o nosso olhar com o seu, o nosso transforma-se em olhar de ternura, reconciliação e fraternidade", disse Francisco.
 

Mariangela Jaguraba - Vatican News

O Papa Francisco recebeu em audiência nesta segunda-feira (29/03), na Sala Clementina, no Vaticano, os membros da Comunidade do Pontifício Colégio Mexicano.

O Pontífice iniciou o seu discurso, recordando o seu encontro com o povo mexicano durante a sua viagem apostólica ao México, em 2016, "que de certa forma se renova em cada ano com a celebração da Solenidade da Nossa Senhora de Guadalupe aqui na Basílica Vaticana", disse ele.

A seguir, Francisco ressaltou que os problemas atuais exigem dos sacerdotes a necessidade de se configurarem ao Senhor e ao olhar de amor com que Ele nos contempla. "Ao conformar o nosso olhar com o seu, o nosso transforma-se em olhar de ternura, reconciliação e fraternidade", disse o Papa, destacando esses três pontos.

Autêntica compaixão

O primeiro, "a necessidade de ter um olhar de ternura com que o nosso Deus Pai vê os problemas que afligem a sociedade: violência, desigualdades sociais e económicas, polarização, corrupção e falta de esperança, especialmente entre os jovens". "A configuração cada vez mais profunda com o Bom Pastor desperta em cada sacerdote uma autêntica compaixão, tanto pelas ovelhas a ele confiadas como por aquelas que se extraviaram. Somente ao deixarmo-nos moldar por Ele se intensifica a nossa caridade pastoral, onde ninguém é excluído da nossa solicitude e oração", sublinhou Francisco.

Comprometermo-nos com o restabelecimento da justiça

Em segundo lugar, o Papa destacou que "é preciso ter um olhar de reconciliação".

As dificuldades sociais que estamos a atravessar, as enormes diferenças e a corrupção exigem de nós um olhar que nos torne capazes de tecer juntos os vários fios que se fragilizaram ou foram cortados na tilma multicolorida de culturas que compõem o tecido social e religioso da nação, prestando atenção, sobretudo, àqueles que foram descartados devido às suas raízes indígenas ou da sua particular religiosidade popular. Nós pastores somos chamados a ajudar a reconstruir relações respeitosas e construtivas entre pessoas, grupos humanos e culturas dentro da sociedade, propondo a todos "deixarmo-nos reconciliar por Deus" e comprometermo-nos com o restabelecimento da justiça.

Um olhar que facilite a comunhão

Por fim, "o nosso tempo atual impele-nos a ter uma visão de fraternidade. Os desafios que enfrentamos são de tal magnitude que abrangem o tecido social e a realidade globalizada interconetada pelas redes sociais e os meios de comunicação. Por isso, junto com Cristo, Servo e Pastor, devemos ser capazes de ter uma visão de conjunto e unidade, que nos impulsiona a criar fraternidade, que nos permite evidenciar os pontos de conexão e interação no coração das culturas e na comunidade eclesial".

Um olhar que facilite a comunhão e a participação fraterna, que anime e oriente os fiéis a respeitarem a nossa Casa comum e serem construtores de um mundo novo, em colaboração com todos os homens e mulheres de boa vontade. Para ser assim, precisamos da luz da fé e da sabedoria de quem sabe “tirar as sandálias” para contemplar o mistério de Deus e, deste ponto de vista, ler os sinais dos tempos.

Não subestimar as tentações mundanas

Segundo o Papa, "é fundamental harmonizar na formação permanente as dimensões académica, espiritual, humana e pastoral. Ao mesmo tempo, precisamos de nos conscientizar das nossas deficiências pessoais e comunitárias, bem como das negligências e faltas que temos de corrigir na nossa vida. Somos chamados a não subestimar as tentações mundanas que podem levar a um conhecimento pessoal insuficiente, a atitudes autorreferenciais, ao consumismo e às várias formas de evasão de nossas responsabilidades".

O Papa concluiu, pedindo a Nossa Senhora de Guadalupe e a São José para que cuidem de todo o Clero do México e da comunidade do Pontifício Colégio Mexicano.

VN

28 março 2021

Semana Santa 2021 - Homilia de Domingo de Ramos na Paixão do Senhor

 

 

A vitória de Deus

A entrada de Jesus em Jerusalém, naquele dia de hoje, correspondeu imediatamente às antigas expetativas de muitos, alvoroçados pelo que ouviam dizer dele e do que fizera. Na verdade, tanto se contava, há dois ou três anos já, da Galileia à Judeia, tão ao encontro de antigas profecias… E o que Ele mesmo dissera, ecoando palavras e promessas que a tradição guardava, dos antigos reis aos profetas, deixando entender que nele se cumpriam…
Por isso irrompiam as exclamações. Ali vinha Ele, montado num jumentinho, como se profetizara do Messias Rei que chegaria: “Hossana! Bendito o que vem em nome do Senhor! Bendito o Reino do nosso pai David que está a chegar. Hossana nas alturas!” (Mc 11, 9-10). 
Compreende-se e aceita-se que assim fosse, sobretudo quando a situação daquele povo era exatamente o contrário. Sob um império pagão que o oprimia, à mercê de governadores cruéis como Pilatos, tudo contradizia o que fora séculos atrás, jamais esquecidos. Isso mesmo acicatava a esperança de muitos e até provocava a revolta de alguns, que de tempos a tempos se insurgiam contra o domínio romano. 
Facilmente encontravam seguidores. Faziam-no mesmo em revolta armada, duramente reprimida depois. Anos mais tarde, foi uma dessas revoltas que levou os romanos a arrasarem o templo, como Jesus avisara. E não foi a última, até à destruição da cidade inteira, no século seguinte… Talvez haja uma referência a tais despistes messiânicos na conhecida frase de Jesus: «… o Reino do Céu tem sido objeto de violência e os violentos apoderam-se dele à força» (Mt 11, 12). 
A confusão existia, mesmo no círculo dos discípulos. Dias depois, no Getsémani, ainda aconteceria assim, aquando da prisão de Jesus: «Um dos que estavam com Jesus levou a mão à espada, desembainhou-a e feriu um servo do Sumo Sacerdote, cortando-lhe uma orelha. Jesus disse-lhe: “Mete a tua espada na bainha, pois todos quantos se servirem da espada morrerão à espada”» (Mt 26, 51-52). Lição difícil de aprender…
Como igualmente sabemos, os próprios romanos suspeitavam das intenções de Jesus e Pilatos condenou-o por isso, como atesta o título que lhe mandou pôr na cruz; e mesmo que Jesus rejeitasse qualquer conotação bélica ou política da sua realeza.
Mas era assim a expetativa vulgar. Não a intenção de Jesus, como nunca o fora, aliás. Lembramos o que sucedera tempos antes, quando o quiseram fazer rei, depois da multiplicação dos pães: «Jesus, sabendo que viriam arrebatá-lo para o fazerem rei, retirou-se de novo, sozinho, para o monte» (Jo 6, 15).
Mas, não sendo essa a intenção de Jesus, era bem a expetativa de muitos. Terá sido até o motivo da deceção do Iscariotes, que passou de discípulo a traidor. - E também doutros, que o aclamaram com ramos e daí a dias lhe pediram a morte no pretório de Pilatos? Fica a pergunta, certamente para eles, mas não só para eles…

 

 
NOTA: Se utilizar o seu TELEMÓVEL e não conseguir aceder ao VIDEO contido nesta página, siga as instruções indicadas AQUI

Na verdade, não foi apenas naquela altura que aconteceram despistes e deceções em relação a Jesus e ao que esperavam dele. Dois mil anos de Cristo no mundo, como a ressurreição lhe alargou a presença, acrescentam numerosos exemplos àqueles primeiros dias – outros tantos alertas para nós.
Não faltaram nem faltam situações de perseguição, em que os mártires testemunham o modo vitorioso de Cristo, ganhando a vida que com ele entregam. Mas noutros sobrevém a deceção duma vitória meramente humana e pouco duradora. Como não faltam situações de torpor espiritual; ou de revestimento, assim dito, “cristão” de sociedades e épocas, em que o contraste evangélico se dilui e ofusca. – Como se o fim dos tempos viesse cedo demais, sendo tanto o que falta ultimar em Cristo! Este engano, tão repetido, ontem e ainda hoje, deu sempre azo a frustrações e abandonos. Às vezes com boa vontade, mas não com vontade convertida.
Primeiro, o Evangelho há de chegar a toda a terra – alargada aos confins do mundo inteiro. Mundo que espiritualmente ultrapassa qualquer geografia, para tocar o mais profundo e decisivo da alma de cada um. E falta tanto, sobretudo porque muitos que o escutaram não tiveram “ouvidos para ouvir”. Lembremos o aviso de Jesus: «Este Evangelho do Reino será proclamado em todo o mundo, para se dar testemunho diante de todos os povos. E então virá o fim» (Mt 24, 14). Uma meta que havemos de alcançar, se convertermos o desejo em missão. 
Expetativas mundanas e expetativas divinas, realmente tão diferentes. De Deus há, isso sim, a vontade permanente de nos reaver como filhos. Para tal, teve de fazer da sua própria Palavra criadora uma Palavra redentora, que superasse na humanidade e por dentro dela, toda a distância que alongámos d’Ele. Assim aconteceu em Cristo, que se fez um de nós para nos fazer de Deus. 

Caminho tão difícil, que passou pela morte, para a preencher de vida, sendo essa a vitória de Deus.
Essa sim era o último inimigo a vencer – não os romanos ou outro que fosse, para um messianismo demasiado fácil, como tantos esperavam com aquelas aclamações dúbias e inconstantes.
Nos dias que se seguem, meditaremos de novo e ainda mais nos derradeiros que Jesus passou na terra, para que tudo se ultimasse nele, finalmente nele e ao seu único modo. Em tempos tão difíceis como estes, entre tanto sofrimento passado e tanta interrogação para o futuro, fixemo-nos na cruz onde expirou, para que o seu Espírito se espalhasse em toda a terra, como vários sinais hoje o confirmam. Assim os oferece a abnegação de muitos e assim os reconhecemos gratamente nós.
Não os procuremos por de fora, mas aí mesmo onde se somam diariamente gestos solidários, saúdes cuidadas, solidões acompanhadas e trabalhos mantidos. Em tudo o que houver de vida entregue, aí mesmo a cruz triunfa agora. A cruz de Cristo, que salva a cruz do mundo. 
- Era a única vitória que Deus queria, como Jesus a conseguiu e o Espírito a difunde. Só esta perpetuará os ramos e os hossanas deste dia!

 
Sé de Lisboa, 28 de março de 2021
+ Manuel, Cardeal-Patriarca 

Patriarcado de Lisboa

Angelus. O Papa: ao longo da via-sacra diária, aproximemo-nos dos irmãos necessitados

 
 Missa e Angelus na Basílica Vaticana, neste Domingo de Ramos, início da Semana Santa 
 28.03.2021 (Vatican Media) 
 
 
Pela segunda vez, vivemos a Semana Santa no contexto da pandemia e do agravamento da crise económica. “Nesta situação histórica e social, o que faz Deus? Toma a cruz. Jesus toma a tua cruz, ou seja, assume o peso do mal que tal realidade implica, o mal físico, psicológico e sobretudo espiritual, porque o Maligno aproveita-se das crises para semear desconfiança, desespero e discórdia”, disse o Papa no Angelus este Domingo de Ramos (28/03), início da Semana Santa

Raimundo de Lima – Vatican News

No términus da Eucaristia presidida pelo Papa na Basílica de São Pedro, antes da bênção final da Missa deste Domingo de Ramos, em que celebramos a entrada triunfal de Jesus em Jerusalém, Francisco conduziu o Angelus.

Na alocução que precedeu a oração mariana, Francisco ressaltou que entramos na Semana Santa, recordando que pela segunda vez a vivemos em contexto da pandemia. “No ano passado estávamos mais chocados, este ano estamos mais provados. E a crise económica tornou-se grave”, frisou.

Deus toma a cruz, Jesus toma a cruz

“Nesta situação histórica e social, o que faz Deus? Toma a cruz. Jesus toma a tua cruz, ou seja, assume o peso do mal que tal realidade implica, o mal físico, psicológico e sobretudo espiritual, porque o Maligno aproveita-se das crises para semear desconfiança, desespero e discórdia”, continuou o Pontífice.

“E nós? O que devemos fazer? A Virgem Maria, a Mãe de Jesus que é também a sua primeira discípula, mostra-nos. Ela seguiu o seu Filho. Tomou sobre si a sua própria parcela de sofrimento, de escuridão, de abatimento, e percorreu o caminho da paixão, mantendo a lâmpada da fé acesa no seu coração. Com a graça de Deus, também nós podemos fazer este caminho”, exortou o Papa, acrescentando:

“Ao longo da via-sacra diária, encontramos os rostos de tantos irmãos e irmãs em dificuldade: não passemos adiante, deixemos que o coração seja movido para a compaixão e nos aproximemos. No momento, como o Cirineu, poderemos pensar: "Por que logo eu?" Mas depois descobriremos o presente que, sem o nosso mérito, nos foi dado. Que Nossa Senhora, que nos precede sempre no caminho da fé, nos ajude.”

VN

O Papa no Domingo de Ramos: Jesus sobe à cruz para descer ao nosso sofrimento

 

 A Santa Missa do Domingo de Ramos, presididas pelo Papa Francisco, na Basílica de S. Pedro- 22.03.21 (Vatican Media) 

 
“No Crucificado, vemos Deus humilhado, o Onipotente reduzido a um descartado. E, com a graça do assombro, compreendemos que, acolhendo quem é descartado, aproximando-nos de quem é humilhado pela vida, amamos Jesus, porque Ele está nos últimos, nos rejeitados”, disse o Papa Francisco neste Domingo de Ramos, início da Semana Santa, na missa celebrada esta manhã (28/03) na Basílica de S. Pedro

 

Raimundo de Lima – Vatican News

O Papa Francisco presidiu na manhã deste domingo (28/03), na Basílica de S. Pedro, a missa do Domingo de Ramos, início da Semana Santa, em que celebraremos os mistérios da Paixão, morte e Ressurreição de Cristo.

Com uma presença limitada de fiéis no respeito às medidas sanitárias previstas devido às exigências que a crise pandémica da Covid-19 impõe, a celebração teve início com a tradicional bênção dos ramos, que recorda a entrada triunfante de Jesus em Jerusalém.

O rito foi feito aos pés do Altar da Confissão da Basílica Vaticana: os fiéis tinham nas mãos os ramos de oliveira. Depois de abençoar os ramos e ser lido um breve texto do Evangelho que narra a entrada de Jesus em Jerusalém, o Papa dirigiu-se ao altar da Cátedra, prosseguindo a missa.

Olhar para a cruz

“Nesta Semana Santa, ergamos o olhar para a cruz a fim de recebermos a graça do assombro”, disse o Pontífice na sua homilia, destacando, entre outros, a necessidade de se passar da admiração à surpresa.

Todos os anos, disse, esta liturgia cria em nós uma atitude de espanto, de surpresa: “passamos da alegria de acolher Jesus, que entra em Jerusalém, à tristeza de O ver condenado à morte e crucificado. É uma atitude interior que nos acompanhará ao longo da Semana Santa. Abramo-nos, pois, a esta surpresa”, exortou.

“Jesus começa logo por surpreender-nos. O seu povo acolhe-O solenemente, mas Ele entra em Jerusalém num jumentinho”, continuou Francisco. Pela Páscoa, o seu povo espera o poderoso libertador, mas Jesus vem cumprir a Páscoa com o seu sacrifício. O seu povo espera celebrar a vitória sobre os romanos com a espada, mas Jesus vem celebrar a vitória de Deus com a cruz, observou.

“O que se passou com aquele povo que, em poucos dias, passou dos ‘hossanas’ a Jesus ao grito ‘crucifica-O’? Aquelas pessoas seguiam mais uma imagem de Messias do que o Messias. Admiravam Jesus, mas não estavam prontas para se deixarem surpreender por Ele.”

Diferença entre surpresa e admiração

A surpresa é diferente da admiração, destacou. A admiração pode ser mundana, porque procura os próprios gostos e anseios; a surpresa, ao contrário, permanece aberta ao outro, à sua novidade, frisou o Papa, acrescentando:

“Também hoje há muitos que admiram Jesus: falou bem, amou e perdoou, o seu exemplo mudou a história... Admiram-No, mas a vida deles não muda. Porque não basta admirar Jesus; é preciso segui-Lo no seu caminho, deixarmo-nos interpelar por Ele: passar da admiração à surpresa.”

E qual é o aspeto do Senhor e da sua Páscoa que mais nos surpreende? – perguntou Francisco, respondendo: “o facto de Ele chegar à glória pelo caminho da humilhação. Triunfa acolhendo a dor e a morte, que nós, súcubos à admiração e ao sucesso, evitaríamos”.

Isto surpreende, observou o Papa, “ver o Omnipotente reduzido a nada; vê-Lo, a Ele, Palavra que sabe tudo, ensinar-nos em silêncio na cátedra da cruz; ver o Rei dos reis que, por trono, tem um patíbulo; ver o Deus do universo despojado de tudo; vê-Lo coroado de espinhos em vez da glória; vê-Lo, a Ele bondade em pessoa, ser insultado e vexado”.

Não estamos sozinhos: Deus está connosco em cada ferida

O Pontífice disse que Jesus sofreu toda esta humilhação para tocar até ao fundo a nossa realidade humana, para atravessar toda a nossa existência, todo o nosso mal; para Se aproximar de nós e não nos deixar sozinhos no sofrimento e na morte; para nos recuperar, para nos salvar.

“Jesus sobe à cruz para descer ao nosso sofrimento. Prova os nossos piores estados de ânimo: o falimento, a rejeição geral, a traição do amigo e até o abandono de Deus. Experimenta na sua carne as nossas contradições mais dilacerantes e, assim, as redime e transforma. O seu amor aproxima-se das nossas fragilidades, chega até onde mais nos envergonhamos.”

Agora sabemos que não estamos sozinhos, frisou o Santo Padre. “Deus está connosco em cada ferida, em cada susto: nenhum mal, nenhum pecado tem a última palavra. Deus vence, mas a palma da vitória passa pelo madeiro da cruz. Por isso, os ramos e a cruz estão juntos”, explicou.

Se a fé perde o assombro, torna-se surda

Peçamos a graça do assombro. A vida cristã, sem surpresa, torna-se cinzenta, disse o Pontífice. “Como se pode testemunhar a alegria de ter encontrado Jesus, se não nos deixamos surpreender cada dia pelo seu amor espantoso, que nos perdoa e faz recomeçar?”

Se a fé perde o assombro, torna-se surda: já não sente a maravilha da graça, deixa de sentir o gosto do Pão da vida e da Palavra, fica sem perceber a beleza dos irmãos e o dom da criação. Nesta Semana Santa, ergamos o olhar para a cruz a fim de recebermos a graça do assombro, exortou o Papa.

Francisco observou que o Espírito Santo é Aquele que nos dá a graça do assombro, convidando-nos a recomeçar do espanto, a olhar para o Crucificado.

Jesus está nos últimos, nos rejeitados

“No Crucificado, vemos Deus humilhado, o Omnipotente reduzido a um descartado. E, com a graça do assombro, compreendemos que, acolhendo quem é descartado, aproximando-nos de quem é humilhado pela vida, amamos Jesus, porque Ele está nos últimos, nos rejeitados.”

O Evangelho de hoje, imediatamente depois da morte de Jesus, mostra-nos o ícone mais belo da surpresa. É a cena do centurião, que, “ao vê-Lo expirar daquela maneira, disse: ‘Verdadeiramente este homem era Filho de Deus!’”, frisou o Santo Padre, concluindo com uma exortação:

“Hoje, Deus ainda surpreende a nossa mente e o nosso coração. Deixemos que nos impregne deste assombro, olhemos para o Crucificado e digamos também nós: ‘Vós sois verdadeiramente Filho de Deus. Vós sois o meu Deus’.”

VN