31 dezembro 2022

A gratidão do Papa a Bento XVI: Só Deus conhece os seus sacrifícios pelo bem da Igreja

 
 Na Basílica de S. Pedro estavam oito mil pessoas 
 
"Com comoção, recordamos a sua pessoa tão nobre, tão amável. E no coração sentimos tanta gratidão: gratidão a Deus por tê-lo dado à Igreja e ao mundo; gratidão a ele, por todo o bem que fez e, sobretudo, pelo seu testemunho de fé e oração, especialmente nestes últimos anos da sua vida retirada. Só Deus conhece o valor e a força da sua intercessão, dos seus sacrifícios oferecidos pelo bem da Igreja", disse Francisco nas Vésperas na Basílica de São Pedro.
 

Bianca Fraccalvieri – Vatican News

Gratidão: este foi o sentimento expresso pelo Papa Francisco ao recordar Bento XVI, que morreu esta manhã aos 95 anos.

Celebrando as Vésperas na Basílica Vaticana, o Pontífice começou a homilia meditando sobre a frase extraída da segunda leitura, da Carta de São Paulo aos Gálatas: “Nascido de uma mulher”.

“Ele não nasceu numa mulher, mas de uma mulher. É essencialmente diferente: significa que Deus quis ser da mesma carne dela”, explicou o Papa. Assim, ela começou o lento caminho da gestação de uma humanidade livre do pecado e repleta de graça e de verdade, repleta de amor e de fidelidade.

Este caminho prossegue até hoje, com o qual Deus convida-nos a segui-lo através de inúmeras virtudes humanas. Entre elas, Francisco quis destacar uma: a amabilidade ou gentileza. E eis que aflorou a lembrança do Papa emérito:

“E por falar em amabilidade, neste momento, o pensamento volta-se espontaneamente para o querido Papa emérito Bento XVI, que nos deixou esta manhã. Com comoção recordamos a sua pessoa tão nobre, tão amável. E no coração sentimos tanta gratidão: gratidão a Deus por tê-lo dado à Igreja e ao mundo; gratidão a ele, por todo o bem que fez e, sobretudo, pelo seu testemunho de fé e oração, especialmente nestes últimos anos da sua vida retirada. Só Deus conhece o valor e a força da sua intercessão, dos seus sacrifícios oferecidos pelo bem da Igreja.”

Retomando o conceito da amabilidade, Francisco afirma que se trata de uma virtude indispensável para viver em paz, a ser recuperada e exercida a cada dia para ir contra a corrente e humanizar as nossas sociedades. Um antídoto contra algumas patologias, como o individualismo consumista, a crueldade e a ansiedade.

Estas "doenças" do nosso dia a dia tornam-nos agressivos e incapazes de pedir "licença", ou "desculpa", ou simplesmente dizer "obrigado".

Quando encontramos na rua ou numa loja uma pessoa gentil, disse o Papa, ficamos maravilhados, parece-nos um pequeno milagre, porque infelizmente a amabilidade já não é muito comum. Mas ainda existem pessoas gentis.

Estes então são os votos do Pontífice:

“Queridos irmãos e irmãs, penso que resgatar a amabilidade como virtude pessoal e cívica pode ajudar muito a melhorar a vida nas famílias, nas comunidades e nas cidades. A experiência ensina que ela, ao tornar-se um estilo de vida, pode criar uma convivência saudável, pode humanizar as relações sociais dissolvendo a agressividade e a indiferença.”

Por fim, uma recomendação a venerar a Mãe de Deus. Para a celebração das Vésperas, estava na Basílica a imagem de Nossa Senhora do Carmo de Avigliano, no sul da Itália:

“Não subestimemos o mistério da maternidade divina! Deixemo-nos maravilhar pela escolha de Deus, que poderia ter aparecido no mundo de mil maneiras mostrando o seu poder, e ao invés quis ser concebido livremente no seio de Maria. (...) Não passemos apressados, paremos para contemplar e meditar, porque aqui está um traço essencial do mistério da salvação. E procuremos aprender o “método” de Deus, o seu respeito infinito, por assim dizer a sua ‘bondade’, porque na maternidade divina da Virgem está o caminho para um mundo mais humano.”

VN

Bento XVI: Mensagem do Cardeal-Patriarca de Lisboa

 

 

Bento XVI deixa-nos um grande legado, do qual destaco, primeiro, a lucidez com que seguia todos os debates culturais e religiosos e a clareza com que se pronunciava a seu propósito, oralmente ou por escrito, com crentes ou não crentes. 

Depois, a centralidade que sempre deu à Pessoa de Jesus Cristo, como fulcro e norma da fé da Igreja, bem como nas suas fecundas considerações sobre o amor e a caridade.

Finalmente, a determinação com que levou por diante a vida interna da Igreja e com que decidiu resignar, quando concluiu que já não estava em condições para exercer o ministério.

Em suma, um legado de inteligência, determinação e liberdade.

Deus o guarde e nos ilumine no seguimento do seu exemplo!


Lisboa, 31 de dezembro de 2022

+ Manuel Clemente, Cardeal-Patriarca de Lisboa

 Patriarcado de Lisboa

30 dezembro 2022

Pelé: "Deus deu-me o dom de saber jogar futebol"

 
 Papa recebeu em 2014 camiseta da seleção autografa por Pelé 
 
"Deus deu-me o dom de saber jogar futebol, porque realmente é só um dom de Deus. Meu pai ensinou-me a usá-lo, ensinou-me a importância de estar sempre pronto e treinado, e que além de jogar bem, devia ser também um homem." A declaração foi publicada pelo jornal vaticano em 2009.
 

Bianca Fraccalvieri - Vatican News

Quem foi melhor: Pelé ou Maradona?

Nos seus quase 10 anos de pontificado, o Papa ouviu e fez esta pergunta inúmeras vezes quando se encontrou com brasileiros nas suas audiências.

A opinião de Francisco não conhecemos, mas sabemos do valor que o Pontífice atribui ao desporto, assim como os seus antecessores que se encontraram com Pelé.

Francisco não teve a ocasião, mas ganhou do Rei, em 21 de fevereiro de 2014, uma camiseta da seleção brasileira autografada com os dizeres: "Para o Papa Francisco, com respeito e admiração. Edson Pelé".

Na Alemanha, por ocasião da Jornada Mundial da Juventude, em 20 de agosto de 2005 Bento XVI recebeu Pelé por ter sido escolhido pela prefeitura como "embaixador" do evento. "Parece que a gente está a falar mais perto de Cristo quando é abençoado pelo Papa. Ele pegou nas minhas mãos e disse: 'O desporto é muito importante para o ser humano. Foi uma benção maravilhosa."

Nos seus 82 anos de vida, o Rei ainda foi recebido por dois santos: São João Paulo II e São Paulo VI.

O jornal do Vaticano, L'Osservatore Romano, publicou na sua edição de 9 de julho de 2009, a seguinte declaração:

"Deus deu-me o dom de saber jogar futebol, porque realmente é só um dom de Deus. Meu pai ensinou-me a usá-lo, ensino-me a importância de estar sempre pronto e treinado, e que além de jogar bem, devia ser também um homem.

De certos valores tive ainda o privilégio de falar com três Papas. Com efeito, considero-me um homem muito abençoado porque pude encontrar e receber a bênção de Paulo VI, João Paulo II e Bento XVI. Daqueles encontros guardo com prazer as fotografias que o Vaticano me enviou. Com estes três Pontífices pude falar da minha vida e de Deus. Foram momentos muito importantes para mim, que ficaram no coração."

VN

28 dezembro 2022

Papa: rezemos por Bento XVI, ele está doente e no silêncio apoia a Igreja

 
 Papa Francisco e Bento XVI - (Vatican News) 
 
NJo final da Audiência Geral, Francisco pediu aos fiéis uma "oração especial" pelo seu antecessor de 95 anos: "Que o Senhor o sustente neste testemunho de amor à Igreja até ao fim". O Diretor da Sala de Imprensa do Vaticano lançou um comunicado na manhã afirmando: "A situação no momento permanece sob controle, constantemente monitorada pelos médicos"
 

Salvatore Cernuzio – Vatican News

No meio das saudações aos fiéis italianos no final da Audiência Geral desta quarta-feira (28), destacando-se do texto escrito, Francisco, olhando para os presentes na Sala Paulo VI, confiou-lhes uma intenção muito precisa: "Uma oração especial pelo Papa emérito Bento XVI, que no silêncio está a sustentar a Igreja". "Recordemos, ele está muito doente, pedindo ao Senhor que o console e o sustente neste testemunho de amor à Igreja até ao fim".

No Mater Ecclesiae

Poucas palavras, pronunciadas pelo Papa Francisco, que insinuam o delicado estado de saúde de Bento XVI, que completou 95 anos em 16 de abril passado. Joseph Ratzinger, que após a sua demissão em fevereiro de 2013, mora no Mosteiro Mater Ecclesiae, nos Jardins do Vaticano. Ele é assistido pelas consagradas Memores Domini e pelo seu secretário pessoal, Dom Georg Gänswein, que ao longo dos anos falou sempre de uma vida passada em oração, música, estudo e leitura.

A ligação entre Francisco e Bento

Em numerosas ocasiões, Francisco falou da ligação com seu antecessor, a quem ele chamou de "pai" e "irmão" no Angelus de 29 de junho de 2021, por ocasião do 70º aniversário da ordenação sacerdotal de Ratzinger. Desde o início do seu pontificado, o Papa Francisco iniciou a "tradição" de visitar o Pontífice Emérito, começando com a primeira histórica visita logo após a sua eleição em que chegou de helicóptero à residência de Castel Gandolfo, onde Bento XVI permaneceu algumas semanas antes de se mudar para o Vaticano. No período que antecede o Natal ou a Páscoa ou por ocasião de consistórios com novos cardeais, Francisco mostrou sempre  um gesto de proximidade e cortesia ao visitar o mosteiro do Vaticano para votos de felicitações e saudação.

Visita a Bento XVI após a Audiência

Após a Audiência Geral, respondendo a perguntas de jornalistas, o Diretor da Sala de Imprensa da Santa Sé, Matteo Bruni, afirmou o seguinte:

"Quanto ao estado de saúde do Papa Emérito, para quem o Papa Francisco pediu orações no final da Audiência Geral desta manhã, posso confirmar que nas últimas horas houve um agravamento devido ao avanço da idade. A situação no momento permanece sob controle, constantemente monitorada pelos médicos". Afirmando ainda que, "no final da Audiência Geral, o Papa Francisco foi ao mosteiro Mater Ecclesiae para visitar Bento XVI. Nós nos unimos a ele na oração pelo Papa Emérito".

VN

Papa: Natal é festa, mas não esquecer que a manjedoura é o trono de Jesus

 
 
No dia do quarto centenário da morte de São Francisco de Sales, o Papa inspirou a sua catequese nos ensinamentos de Natal do Santo e Doutor da Igreja, anunciando ainda a publicação de uma Carta Apostólica intitulada "Tudo pertence ao amor". 
 

Bianca Fraccalvieri – Cidade do Vaticano

Na Sala Paulo VI, o Papa realizou a última Audiência Geral do ano de 2022.

Neste tempo litúrgico, Francisco fez uma pausa no ciclo sobre o discernimento e dedicou sua catequese ao mistério do Natal, inspirando-se num santo em particular: São Francisco de Sales.

Por ocasião do quarto centenário da morte deste Bispo e Doutor da Igreja, o Pontífice anunciou que hoje será publicada a Carta Apostólica intitulada "Tudo pertence ao amor".

Manjedoura

Numa das suas muitas cartas dirigidas a Santa Joana Francisca de Chantal, São Francisco de Sales escreve: "Eu prefiro cem vezes ver o querido Menino na manjedoura, do que todos os reis nos seus tronos".

Jesus, o Rei do universo, comentou o Papa, “nunca se sentou num trono, nasceu num estábulo, envolto em faixas e deitado numa manjedoura; e no fim morreu numa cruz e, envolto num lençol e foi deposto no sepulcro”.

A manjedoura, portanto, não é apenas um detalhe logístico, mas um elemento simbólico para entender que tipo de Messias é Aquele que nasceu em Belém, ou seja, quem é Jesus.

“O sinal é: encontrarão um menino sobre uma manjedoura. Este é sinal. O trono de Jesus ou é a manjedoura ou a rua, durante a sua vida, pregando, ou a cruz no final da vida. Este é o trono do nosso Rei.”

Este sinal mostra o 'estilo' de Deus, que é proximidade, compaixão e ternura e quer atrair-nos com o amor.

Noutra carta a uma religiosa, sempre no contexto do Natal, São Francisco de Sales escreve: "O íman atrai o ferro e o âmbar atrai a palha e o feno".

Amor

Às vezes, explicou Francisco, somos '"ferro", isto é, somos duros, rígidos, frios. Noutros momentos, somos "palha", frágeis, fracos, inconsistentes. "As nossas forças, as nossas fragilidades, só se resolvem diante do presépio, ou diante da Cruz." Então, Deus encontrou o meio para nos atrair como somos: com o amor. 

“Não é um amor possessivo e egoísta, como infelizmente é tão frequente o amor humano. O seu amor é puro dom, pura graça, é tudo e somente para nós, para o nosso bem. E assim ele nos atrai, com este amor desarmado e desarmante.”

“Quando vemos esta simplicidade de Jesus, também nós jogamos fora as armas da soberba e vamos ali, humildes, pedir salvação, perdão, luz para a nossa vida, para poder ir em frente. Não se esqueçam do trono de Jesus: a manjedoura e a cruz.”

Pobreza

Outro aspeto que se destaca no presépio é a pobreza, entendida como a renúncia a toda vaidade mundana. E hoje, lamentou o Pontífice, quanto dinheiro é gasto por vaidade. São Francisco de Sales escreve ainda: "Não encontro outro mistério em que a ternura e a austeridade, amor e tristeza, doçura e dureza sejam tão docemente misturados”. O Natal certamente é alegria e festa, mas na simplicidade e austeridade, completou o Papa.

“Hoje vemos 'outro Natal', entre aspas, uma caricatura mundana do Natal, que o reduz a uma festa de consumo. Pode-se fazer festa, isto é bom, mas que não seja Natal. Natal é outra coisa.”

Francisco conclui com mais um pensamento de São Francisco de Sales dois dias antes da sua morte, em que afirma que “não devemos desejar nada nem recusar nada, suportando tudo o que Deus nos enviará, o frio e as agruras do tempo".

Estas palavras, afirmou o Papa, significam que devemos aceitar tudo o que Deus nos manda, “mas atenção: sempre e só por amor, porque Deus nos ama e quer sempre e só o nosso bem”. O caminho da felicidade, concluiu, passa pela manjedoura e pela cruz.

“A todos vós e vossas famílias, ainda Feliz Natal e um bom início de Ano Novo!”, foram os votos finais de Francisco.

VN

26 dezembro 2022

O NATAL JÁ PASSOU!!?!


 
Passou o Natal!
Já lá vai!
Para o ano há mais!

Pois, o problema é esse mesmo, ou seja, colocar nas nossas cabeças e nos nossos corações que o Natal já passou e só para o próximo ano ele volta.

Esquecemo-nos que o Natal «cresce em sabedoria, em estatura e em graça, diante de Deus e dos homens» (cf Lc 2, 52)

Esquecemo-nos de que o Menino se vai fazer Homem e nos vai olhar olhos nos olhos e dizer-nos como todo o amor, «Segue-me» (cf Mt 9, 9)

Esquecemo-nos que o Menino se vai fazer Homem e vai «orar por nós instantemente, e o suor vai tornar-se como grossas gotas de sangue, que caiem na terra.» (cf Lc 22, 44)

Esquecemo-nos que o Menino se vai fazer Homem e vai dar a vida por nós e mesmo na Cruz há-de pedir por nós dizendo «Perdoa-lhes, Pai, porque não sabem o que fazem.» (cf Lc 23, 34)

Esquecemo-nos que o Menino se vai fazer Homem e na Cruz vai dizer a Sua mãe, «Mulher, eis aí os teus filhos» e a cada um de nós, «Eis aí a vossa mãe» (cf Jo 19, 26-27)

Esquecemo-nos que o Menino se vai fazer Homem e entregar-se totalmente por nós até dizer no derradeiro momento, «Tudo está consumado». (cf Jo, 19, 30)

Esquecemo-nos que o Menino se vai fazer Homem e, depois de ter morrido na Cruz, vai ressuscitar e dizer a cada um de nós, «Mas ides receber uma força, a do Espírito Santo, que descerá sobre vós, e sereis minhas testemunhas em Jerusalém, por toda a Judeia e Samaria e até aos confins do mundo.» (cf Act 1, 8)

Não, o Natal não passou, o Natal não volta apenas para o próximo ano.

O Natal está entre nós e só vivendo-o no dia a dia, sendo testemunhas dEle em todos os momentos e em todos os lugares, o Natal é Natal e, como se diz na gíria popular, o “Natal será sempre que o homem quiser” pela graça de Deus.

Santo Natal a todos na alegria do Deus Menino que se vai fazer Homem para nos salvar.



Marinha Grande, 26 de Dezembro de 2022
Joaquim Mexia Alves

 

Papa: Santo Estêvão, testemunha da caridade, do anúncio e do perdão

 
 
 
“Caridade e anúncio, assim era Estêvão: ele soube unir a caridade e o anúncio. Deixou-nos o seu testemunho no momento da morte, quando seguindo o exemplo de Jesus, perdoou aos seus assassinos”. Palavras do Papa Francisco no Angelus desta segunda-feira (26/12) festividade de Santo Estêvão Mártir
 

Jane Nogara - Vatican News

Na festividade de Santo Estêvão Mártir, o Papa dedicou algumas palavras ao santo no Angelus desta segunda-feira (26) na Praça de São Pedro. Francisco iniciou recordando que na liturgia, logo depois do Natal, são comemoradas figuras dramáticas de Santos mártires, entre eles Santo Estêvão e os Santos Inocentes, as crianças mortas pelo rei Herodes. E pergu-se o porquê, logo ressaltando que não nos devemos acomodar “porque o Natal não é a fábula do nascimento de um rei, mas a vinda do Salvador, que nos livra do mal ao tomar sobre si o nosso mal: o egoísmo, o pecado, a morte. E os mártires são os mais semelhantes a Ele”.

E explica que a palavra mártir significa testemunha: "Os mártires são testemunhas, isto é, irmãos e irmãs que, através das suas vidas, mostram-nos Jesus, que venceu o mal com a misericórdia. E convida todos a interrogarem-se: “nós, damos testemunho dele? E como podemos melhorar nisso? Podemos ser ajudados precisamente pela figura de Santo Estêvão”.

Santo Estêvão

Santo Estêvão, continuou Francisco, como um dos sete diáconos, fora consagrado para servir à mesa, para a caridade, e isso é importante porque Estêvão não se limitava a esta obra de assistência. Isto significa que o seu primeiro testemunho não foi dado em palavras, mas através do amor com o qual servia os mais necessitados.

“A todos que encontrava, falava de Jesus: partilhava a fé à luz da Palavra de Deus e dos ensinamentos dos Apóstolos”

O Papa, seguidamente afirmou que a segunda dimensão do seu testemunho é “acolher a Palavra e comunicar a sua beleza, contar como o encontro com Jesus muda a vida”.

Caridade e anúncio

“Caridade e anúncio, assim era Estêvão. Porém, o seu maior testemunho é ainda outro: ele soube unir a caridade e o anúncio. Deixou-nos o seu testemunho no aos seus assassinos”

A resposta

Eis então, continuou o Papa, a resposta à nossa pergunta: “nós podemos melhorar o nosso testemunho através da caridade para com os nossos irmãos e irmãs, da fidelidade à Palavra de Deus e do perdão. Caridade, Palavra, Perdão. É o perdão que diz se realmente praticamos a caridade para com os outros e se vivemos a Palavra de Jesus”.

Por fim Francisco aconselha-nos “Pensemos na nossa capacidade de perdoar, nestes dias em que talvez encontremos, entre muitas outras, algumas pessoas com as quais não nos damos bem, que nos feriram, com as quais nunca mais fizemos as pazes. Peçamos a Jesus recém-nascido a novidade de um coração capaz de perdoar: a força para rezar por aqueles que nos feriram e para dar passos de abertura e de reconciliação”.

VN

25 dezembro 2022

Homilia na Solenidade do Natal do Senhor

 

  

Viveremos dias ultimados

Permiti, caríssimos, que me fixe numa frase essencial, há bem pouco ouvida. Dela tirarei dois pontos realmente finais: Que se conclui em Cristo tudo o que Deus tem para nos dizer de si próprio; e que assim mesmo se ultima o tempo todo, como criação realizada. A frase é esta: «Muitas vezes e de muitos modos falou Deus antigamente aos nossos pais, pelos Profetas. Nestes dias, que são os últimos, falou-nos por seu Filho, a quem fez herdeiro de todas as coisas e pelo qual também criou o universo.»

Fixemo-nos neste começo da Carta aos Hebreus. E admiremo-nos com o facto de nas primeiras gerações já se conseguir enunciar em tão poucas palavras o essencial da doutrina cristã, que aprofundamos desde então. Especialmente o sentido global que contém, tão importante agora para ultrapassarmos desvios ou exclusivismos que o Evangelho de Cristo não permite.

A Carta é escrita especialmente para aqueles judeus que acreditaram em Jesus como o Messias anunciado pela tradição profética. Não mudavam propriamente de religião, antes a reconheciam completada por tudo quanto Jesus fizera e dissera. Não esqueçamos que Ele próprio não dispensava a Lei e os Profetas, mas lhes dava pleno cumprimento: «Não penseis que vim revogar a Lei ou os Profetas. Não vim revogá-los, mas levá-los à perfeição» (Mt 5, 17).

Foi também assim que os cristãos herdaram e honraram tudo o que os antigos crentes tinham transmitido e passado a escrito no que chamamos Antigo Testamento. Também a partir daí entenderam a vida de Jesus, o porquê do seu nascimento e o sentido redentor da sua morte, como Emanuel primeiro e como Servo de Javé depois.


Também continuamos a rezar os salmos, como Jesus fazia e nós com Ele prosseguimos. Dores e alegrias, medos e expetativas, pessoal ou coletivamente expressos na centena e meia de salmos que rezamos, tudo vemos à luz de Cristo, para nos revermos em Deus, que os inspirou. Tudo é humanidade no drama da salmodia e tudo pode ser salvo assim rezado.

Em todo o percurso bíblico houve progresso, de episódios situados em cada tempo e espaço para os significados mais amplos que ganharam depois. Como quem sobe os degraus da mesma escada até chegar ao seu topo e sem saltar nenhum.

Reconhecemos ainda, que tendo Deus falado muitas vezes e de muitos modos ao antigo povo bíblico, a sua voz chegou também a outros e até pelos profetas, como foi com a viúva de Sarepta e Elias, ou com o sírio Naamã e Eliseu.

Trechos como estes, não são únicos na tradição veterotestamentária e continuaram com Jesus, que chegou a elogiar no centurião romano uma fé maior do que entre os seus: «Em verdade vos digo: Não encontrei ninguém em Israel com tão grande fé! Digo-vos que, do Oriente e do Ocidente, muitos virão sentar-se à mesa do banquete com Abraão, Isaac e Jacob, no Reino do Céu…» (Mt 8, 10-11). A fé, sendo virtude teologal, é já comunicação divina. E o Natal de Jesus não tem fronteiras.

Detive-me aqui, porque, como o Papa Francisco tem insistido, é justo e necessário reconhecer que Deus não está ausente de tudo quanto existe de mais autêntico nas várias tradições humanas. A tradição bíblica, que herdamos e prosseguimos, exatamente pela grande humanidade que transporta, mesmo nas contradições que não esconde, é uma história padrão onde todas as outras podem encontrar acolhimento e campo aberto de diálogo e caminho em comum. Até certo ponto, é verdade; mas no ponto certo onde nos reencontramos como criação divina, presente em cada um, venha donde vier.

Lembremos como várias dessas outras tradições foram incorporadas no texto bíblico e, mesmo quando reinterpretadas, não foram dispensadas. Ou como São Paulo se aproximou da moral estoica, para a retidão das condutas, ou citou poetas gregos no seu discurso aos atenienses, para melhor falar do Deus de todos.

Na cidade e no tempo em que vivemos, creio terem lugar considerações deste género, rumo a uma convivência em que se respeite e admire a contribuição de tanta gente, com o que nos traz de melhor, em humanidade alargada. Creio que o Natal de Cristo também passa por aí.

Reparemos, a propósito, que o trecho da Carta aos Hebreus diz que «Deus nos falou por seu Filho, a quem fez herdeiro de todas coisas e pelo qual também criou o universo». Nada lhe é estranho, portanto, no que à criação diz respeito. Esta é a base comum em que Jesus a situa e inteiramente perfaz. Podemos dizer que é o lugar do seu Natal, assim completo.


Dizia-nos também o texto da Carta aos Hebreus que “estes dias são os últimos”. Não tenhamos medo da frase, pois não se trata de tempo interrompido, mas sim realizado, nas mais profundas expetativas do coração humano.

Bem vistas as coisas, cada tempo é do tamanho da palavra que o preenche. Palavras ocas dão tempos vazios e mesmo perda de tempo, sabemos bem.

Palavras criativas, em qualquer som que tenham, essas sim, perduram. Vivemos delas no melhor da cultura que subsiste. Por vezes, damos a um tempo o nome de quem nele se expressou, fosse poeta ou músico, fosse filósofo, governante ou cidadão comum. Fosse sobretudo um santo. Tempos definidos por palavras que os demarcam.

Assim de hoje se dirá ser tempo do Papa Francisco, com as suas palavras sempre próximas e dirigidas a quem mais precisa de ser acolhido ou apoiado, como as dedicadas à situação na Ucrânia e noutras regiões devastadas pela guerra, ou referidas à dignidade dos migrantes ou aos problemas climáticos que impedem a sobrevivência das pessoas. Palavras que diz em Roma e nos locais mais problemáticos, sempre que é possível.

Estes dias são os últimos da parte de Deus, porque em Jesus nos diz tudo quanto tem para comunicar de essencial e de Si próprio. Por isso, este Menino é Verbo de Deus e Emanuel, que quer dizer Deus Connosco. Tempo de Deus a preencher o tempo humano, como nos diz Santo Agostinho neste seu passo tão expressivo: «Celebremos o dia feliz, em que o grande e eterno Dia, procedente do grande e eterno Dia, veio inserir-se neste nosso dia temporal e tão breve» (Sermão 185).

Diz também o trecho bíblico que n’Ele todas as coisas foram feitas. Olhemo-Lo então como padrão do que somos e havemos de ser, pois em Jesus tudo foi feito e é refeito, no sentido redentor da sua vinda ao mundo. Jesus é o enunciado final, onde se junta a expressão divina e a grande multiplicidade dos sons em que ressoa.

Em Jesus, como nasceu e viveu, recebemos tudo o que as idades nos trouxeram e continuarão a trazer, no essencial das civilizações e das culturas. A única advertência que lhes fez e fará é a de nunca ultrapassarem a humanidade concreta de cada um para chegarem ao absoluto de Deus. De Deus, que em Si mesmo é comunhão e só na comunhão com os outros se apreende. É esta a verdade do seu Natal. Tudo conflui para Jesus, como as ofertas trazidas de tão longe por aqueles magos que chegaram do Oriente.

Sejamos nós também, hoje e aqui, uma palavra ultimada e oferecida, com verdadeira qualidade cristã, a todos quantos nos procuram nesta cidade cosmopolita de Lisboa ou onde chegar a nossa vida, perto ou longe. A linguagem de Deus é solidária, dita e feita em cada gesto de Cristo e em todos aqueles em quem o seu Espírito trabalha para o bem de muitos.

Precisamos de ouvidos para ouvir deveras o que Deus nos diz no Natal de Cristo. Viveremos dias ultimados, porque nada há a acrescentar onde o amor verdadeiramente aconteça. Rezemos para que assim suceda também com a multidão de jovens de todo o mundo que virão a Lisboa na próxima Jornada Mundial da Juventude. Para que vivam dias tão preenchidos com a experiência de Cristo Vivo, que depois lhes defina a existência inteira e aonde forem.


Sé de Lisboa, 25 de dezembro de 2022

+ Manuel Clemente, Cardeal-Patriarca

Patriarcado de Lisboa

Urbi et Orbi, o Papa: não nos esqueçamos de quem bate à nossa porta

 
 
Hoje como há dois mil anos Jesus, a luz verdadeira, vem a um mundo achacado de indiferença que não O acolhe; antes, rejeita-O como acontece a muitos estrangeiros, ou ignora-O como fazemos nós muitas vezes com os pobres. Hoje não nos esqueçamos dos numerosos deslocados e refugiados que batem à nossa porta: disse o Papa na tradicional Mensagem de Natal e Bênção Urbi et Orbi. Francisco ressaltou que vivemos uma carestia de paz e exortou a não se usar o alimento como arma de guerra
 

Raimundo de Lima – Vatican News

Como os pastores de Belém, deixemo-nos envolver pela luz e saimos para ver o sinal que Deus nos deu. Vençamos o torpor do sono espiritual e as falsas imagens da festa que fazem esquecer Quem é o Festejado. Saiamos do tumulto que anestesia o coração induzindo-nos mais a preparar ornamentações e prendas do que a contemplar o Evento: o Filho de Deus nascido para nós. Foi a exortação do Papa na tradicional Mensagem de Natal e Bênção Urbi et Orbi, da Sacada Central da Basílica Vaticana, diante de milhares de fiéis e peregrinos presentes na Praça São Pedro, e acompanhada pelos meios de comunicação em mundovisão.

“Voltemo-nos para Belém, onde ressoa o primeiro choro do Príncipe da paz. Sim, porque Ele mesmo – Jesus – é a nossa paz: aquela paz que o mundo não se pode dar a si mesmo e Deus Pai concedeu-a à humanidade enviando o seu Filho ao mundo”, ressaltou o Santo Padre.

Na realidade, é com tristeza que devemos constatar como, enquanto nos é dado o Príncipe da paz, ventos de guerra continuam a soprar, gelados, sobre a humanidade. Se queremos que seja Natal, o Natal de Jesus e da paz, voltemos o olhar para Belém e fixemo-lo no rosto do Menino que nasceu para nós! E, naquele rostinho inocente, reconheçamos o das crianças que, em todas as partes do mundo, anseiam pela paz, continuou o Papa.

Ucrânia

O nosso olhar se encha com os rostos dos irmãos e irmãs ucranianos que vivem este Natal na escuridão, ao frio ou longe das suas casas, devido à destruição causada por dez meses de guerra. O Senhor nos torne disponíveis e prontos para gestos concretos de solidariedade a fim de ajudar todos os que sofrem, e ilumine as mentes de quantos têm o poder de fazer calar as armas e pôr termo imediato a esta guerra insensata!

O nosso tempo vive uma grave carestia de paz também noutras regiões, noutros teatros desta terceira guerra mundial.

Síria, Terra Santa, israelitas e palestinos

Pensamos na Síria, ainda martirizada por um conflito que passou para segundo plano, mas não terminou; e pensamos na Terra Santa, onde nos últimos meses aumentaram as violências e os confrontos, com mortos e feridos. Supliquemos ao Senhor para que lá, na terra que O viu nascer, retomem o diálogo e a aposta na confiança mútua entre israelitas e palestinianos.

Médio Oriente

Jesus Menino ampare as comunidades cristãs que vivem em todo o Oriente Médio, para que se possa viver, em cada um daqueles países, a beleza da convivência fraterna entre pessoas que pertencem a crenças diferentes. De modo particular ajude o Líbano para que possa, finalmente, erguer-se com o apoio da Comunidade Internacional e com a força da fraternidade e da solidariedade.

Região do Sahel, Iémen, Mianmar e Irão

A luz de Cristo ilumine a região do Sahel, onde a convivência pacífica entre povos e tradições é transtornada por confrontos e violências, continuou Francisco. “Encaminhe para uma trégua duradoura no Iémen e para a reconciliação no Mianmar e no Irão, para que cesse completamente o derramamento de sangue”.

Continente Americano

E, no continente americano, frisou o Pontífice, “inspire as autoridades políticas e todas as pessoas de boa vontade a trabalharem para pacificar as tensões políticas e sociais que afetam vários países; penso de modo particular na população haitiana, que está a sofrer há tanto tempo”.

O Santo Padre lembrou que a guerra na Ucrânia agravou ainda mais a situação, deixando populações inteiras em risco de carestia, especialmente no Afeganistão e nos países do Chifre de África. “Toda a guerra – bem o sabemos – provoca fome e serve-se do próprio alimento como arma, ao impedir a sua distribuição às populações já atribuladas. Neste dia, aprendendo com o Príncipe da paz, empenhemo-nos todos – a começar pelos que têm responsabilidades políticas – para que o alimento seja só instrumento de paz”, exortou ainda Francisco, que concluiu seguidamente:

Queridos irmãos e irmãs, hoje como há dois mil anos Jesus, a luz verdadeira, vem a um mundo achacado de indiferença - uma doença feia -, indiferença que não O acolhe (cf. Jo 1, 11); antes, rejeita-O como acontece a muitos estrangeiros, ou ignora-O como fazemos nós muitas vezes com os pobres. Hoje não nos esqueçamos dos numerosos deslocados e refugiados que batem à nossa porta à procura de conforto, calor e alimento. Não nos esqueçamos dos marginalizados, das pessoas sós, dos órfãos e dos idosos que correm o risco de acabar descartados, dos presos que olhamos apenas sob o prisma dos seus erros e não como seres humanos.

VN

Homilia da Missa da Noite de Natal

 

 

Guardando de noite os rebanhos…

Nesta celebração em que felizmente estamos, permiti que insista em dois pontos essenciais, para que o Natal nos continue a surpreender: primeiro, eram pastores, os chamados ao Presépio; segundo, era de noite que tal acontecia e é de “noite” que continua a acontecer – mesmo que seja dia. Fixemo-nos na frase evangélica: «Havia naquela região uns pastores que viviam nos campos e guardavam de noite os rebanhos.»

É certo que a temos na memória e não a esquecemos nos nossos presépios, onde não faltam pastores e ovelhas junto do Menino recém-nascido. Mas também aqui se verifica a perenidade do que nos foi transmitido.

Lembremos que se tratava de pastores, gente pobre e pouco conceituada na altura, vivendo no campo e tratando de animais. Mas lembremos igualmente que o próprio Deus se revelara na tradição bíblica como “pastor” do seu povo; e mesmo Jesus se apresentou depois como o “bom pastor”. Bom pastor, com todas as referências que faz ao conhecimento das suas ovelhas, uma a uma, à procura das que se desgarrem do rebanho e à defesa de todas, face a qualquer agressão que surja.

Ainda que pobres de muitas pobrezas, ou exatamente por isso, eram pastores os que ouviram o anúncio angélico. E não foi certamente por acaso, antes requerendo alguma coincidência na atitude que devemos ter. Aqueles pastores dos arredores de Belém faziam-se parábola do que ali sucedia – de Deus para o mundo e do mundo para Deus.

Também aqui as personagens evangélicas se tornam exemplares e motivadoras para nós. O anúncio é dirigido aos que guardavam rebanhos no campo. – Não dirá isto alguma coisa sobre a qualidade dos destinatários, precisamente os que hoje guardam e cuidam dos outros?!

Fica a pergunta, mas adianto alguma resposta. Estou convicto de que agora mesmo, neste ano da graça de 2022, o Natal está a ser muito especialmente vivido por quem se preocupa com os outros e os acompanha e protege. Seja em situações de guerra aberta, como acontece na devastada Ucrânia e noutras partes do mundo; seja em situações de guerra surda, que endurece os corações onde tudo afinal começa, ou se resolve. Seja como for, o Natal acontecerá de verdade onde houver quem se disponha a cuidar de quem precisa.

É assim que a nossa cidade tem esta noite tantos Presépios quantos os lugares e situações em que haja bons pastores dos outros: em casas, hospitais ou mesmo ruas, onde o Menino nos espera em quem carece de algo, física ou espiritualmente que seja.

É bom assinalar o Natal com figurações a propósito, que lembrem o que aconteceu e festejem o que nos foi dado com o nascimento de Jesus. É indispensável que o celebremos, como estamos a fazer aqui, para agradecer a Deus a salvação que assim começou, tão esperada que fora – e continua a ser aonde o seu anúncio ainda não chegou, ou já foi esquecido. Mas tudo isto se há de tornar em missão, concreta e caso e caso, alargando o cuidado daqueles pastores de antanho pelos rebanhos que ali guardavam, noite adentro.

Também esta é uma referência a reter e muito a sério. Coincide bem com o modo de ser divino, que das trevas fez brilhar a luz e mais se manifesta no recôndito dos corações do que nos clarões que estonteiam.

Assim no relato da criação, quando “a luz foi feita”. Assim com Abraão, quando Deus lhe levantou os olhos para as miríades de estrelas que pontuavam de luz o céu noturno. Assim com Moisés, quando saiu do Egito na primeira Páscoa que foi. Assim, Bíblia fora, até àquela noite em que Jesus revelou a Nicodemos o porquê do seu Natal e de tudo o mais: «Tanto amou Deus o mundo, que lhe entregou o seu Filho Unigénito, a fim de que todo o que crê nele não se perca, mas tenha a vida eterna» (Jo 3, 16). Tudo prenúncio da noite em que do sepulcro transbordou a vida do Ressuscitado!

Não foi algo de meramente circunstancial, aquela noite em Belém. Trata-se, isso sim, duma condição para vivermos o Natal de Cristo e quanto ele nos traz. Trata-se de acolher o Emanuel, que quer dizer “Deus Connosco”, estando nós também com Ele, no seu modo de ser e acontecer, geralmente discreto, muito discreto mesmo.

Requer um anoitecer de tudo quando nos distraia. Requer disponibilidade e concentração totais, desfazendo no nosso espírito quanto não seja Deus e a sua manifestação em Cristo: palavra, gesto e rosto, pouco a pouco desvendado.

Aliás, Jesus também rezava de noite, como neste passo evangélico: «Naqueles dias, Jesus foi para o monte fazer oração e passou a noite a orar a Deus» (Lc 6, 12). Realizava na terra o diálogo que eternamente mantém com o Pai. Diálogo oculto aos nossos olhos, ainda que nos chegue pelo Espírito que derramam.

É um ponto importante e uma advertência séria. Importante, porque as coisas, e sobretudo as pessoas, são muito mais do que parecem e só com muita concentração lhes captamos a verdade. Assim em relação aos outros e sobretudo em relação a Deus.

E uma advertência séria, pois corremos o risco de viver exteriormente estes dias, distraídos do essencial que nos oferecem. Do que oferecem, sim, mas apenas a quem anoitece os olhos para vislumbrar o Presépio.

Creio que, pastoralmente falando, é uma das maiores urgências que temos, esta de nos educarmos para uma atitude contemplativa, que feche por um tempo os olhos do corpo e abra os da alma para a luz que desponta.

Não é sem preparação e trabalho que nos tornaremos capazes de adorar a presença sacramental de Jesus eucarístico, qual Natal continuado, como cantou São João da Cruz: «Bem eu sei a fonte que mana e corre, embora seja noite […] E esta eterna fonte está escondida em este vivo pão a dar-nos vida, embora seja noite».

Convenhamos que, se “orar é falar com Deus”, temos muito mais para ouvir do que para dizer… E mais para ver com os olhos da alma do que apenas com os do corpo, tão distraídos geralmente. Se aprendermos isto em relação a Deus, também o faremos em relação aos outros, realmente ouvidos e verdadeiramente vistos. Os outros, em quem o Natal de Cristo continua, à espera de quem o divise na noite.

Talvez por isso, entre as várias Missas de Natal, seja esta particularmente tocante. Toda a tradição mística insiste no motivo, da “noite”, que é necessário fazer em nós, para que Deus amanheça ao nosso olhar profundo. Logo São Paulo, que nos alertou para a necessidade de passarmos do visível ao invisível e finalmente entrevermos o que importa: «Não olhamos para as coisas visíveis, mas para as invisíveis, porque as visíveis são passageiras, ao passo que as invisíveis são eternas» (2 Cor 4, 18).

E o próprio Cardeal Newman, hoje nos altares, foi nesses termos que cantou a sua conversão, caminhando como os pastores ao encontro do Menino Deus: «Luz terna, suave, no meio da noite, leva-me mais longe…» Assim foi e lá nos espera, em Natal alcançado.

Prossigamos então, neste caminho aberto, mesmo quando obscuro. Quando desejamos um “santo” Natal, confessamos que é de Deus e necessariamente ao seu modo. Como foi então e há de ser agora. – Como acontecerá com a Jornada Mundial da Juventude, pela qual sempre rezamos, e será “Natal” para muita gente, mesmo em agosto, compartilhando Cristo vivo pelas mãos da Virgem Mãe!


Sé de Lisboa, 25 de dezembro de 2022

+ Manuel, Cardeal-Patriarca

Patriarcado de Lisboa

22 dezembro 2022

Papa: “Diante do Príncipe da Paz que vem ao mundo, deponhamos toda arma de todo gênero”

 
 
Cada um de nós é responsável pela paz, disse Francisco ao receber os membros da Cúria Romana para as felicitações de Natal. A cultura da paz começa dentro de nós mesmos, erradicando a raiz do ódio e ressentimento.
 

Bianca Fraccalvieri – Vatican News

Gratidão, conversão e paz: estes foram os temas do discurso do Papa aos seus mais estreitos colaboradores da Cúria Romano, recebidos em audiência para os votos de Feliz Natal.

Ao iniciar, Francisco recordou que o nascimento de Jesus é um convite a voltar ao essencial da vida: “A humildade do filho de Deus que vem na nossa condição humana é, para nós, escola de adesão à realidade”.

“Assim como Ele escolhe a pobreza, que não é simplesmente ausência de bens, mas essencialidade, do mesmo modo cada um de nós é chamado a voltar ao essencial da própria vida, para abandonar o que é supérfluo e que pode tornar-se um empecilho no caminho da santidade.”

O Papa agradeceu ao Senhor por todos os benefícios que concedeu este ano, mas entre todos espera que esteja o da conversão. “Esta nunca é um discurso concluída. A pior coisa que nos pode acontecer é pensar que não precisamos mais de conversão, tanto a nível pessoal, como comunitário.”

Converter-mo-nos é aprender sempre mais a levar a sério a mensagem do Evangelho e tentar colocá-lo em prática na nossa vida. Dos eventos eclesiais que marcaram 2022, Francisco citou as comemorações dos 60 anos do início do Concílio Vaticano II, que definiu como “uma grande ocasião de conversão para toda a Igreja”, na tentativa de compreender melhor o Evangelho, de torná-lo atual, vivo e atuante neste momento histórico. E nesta ótica, insere-se a atual reflexão sobre a sinodalidade da Igreja.

Sem conversão, afirmou, pode-se cair na soberba espiritual, no imobilismo, no erro de querer cristalizar a mensagem de Jesus numa única forma válida para sempre. A verdadeira heresia não consiste somente em pregar outro Evangelho, mas em deixar de traduzi-lo nas linguagens e nos modos atuais. Conservar significa manter vivo e não aprisionar a mensagem de Cristo.  

A conversão, disse ainda Francisco, leva a uma atitude de vigilância em relação ao mal, que se transforma sempre em algo mais insidioso. “É uma verdadeira luta”, reconheceu o Papa. E a simples denúncia não é suficiente, com a ilusão de ter resolvido o problema, mas é preciso promover mudanças para não permanecer prisioneiro das lógicas do mal. São os “demónios educados”, que se combatem com a prática quotidiana do exame de consciência.

“Queridos irmãos e queridas irmãs, a todos nós terá acontecido perder-mo-nos como aquela ovelha, ou de nos afastarmos de Deus como o filho menor”, disse o Pontífice. O importante é não “baixar a guarda” e cair na tentação de nos sentirmos seguros só por trabalharmos dentro dos muros da instituição, ao serviço da Santa Sé, no coração do corpo eclesial. “Nós estamos mais em perigo do que todos os outros, porque assediados pelo ‘demónio educado’, que não vem a fazer barulho, mas a trazer flores”, alertou Francisco.

Por fim, o Papa dedicou a parte final do discurso ao tema da paz.

“Nunca como neste momento sentimos um grande desejo de paz. Penso na martirizada Ucrânia, mas também nos muitos conflitos que estão em andamento em várias partes do mundo. A guerra e a violência são sempre uma falência. A religião não deve prestar-se a alimentar conflitos. O Evangelho é sempre Evangelho de paz, e em nome de nenhum Deus se pode declarar ‘santa’ uma guerra.”

Dirigindo o seu pensamento a quem sofre, Francisco recordou que a cultura da paz não se constrói somente entre povos e nações, mas começa no coração de cada um de nós. Por isso, todos podemos contribuir procurando erradicar de dentro de nós toda a raiz de ódio e ressentimento pelas pessoas que vivem ao nosso lado.

“Se é verdade que queremos que o clamor da guerra pare deixando lugar à paz, então cada um se inicie de si mesmo.” Não existe só a violência das armas, recordou, mas a violência verbal, psicológica, do abuso de poder e das maledicências. E fez então um apelo:

“Diante do Príncipe da Paz que vem ao mundo, deponhamos toda a arma de todo género.”

A misericórdia, disse ainda, é aceitar que o outro também tem os seus limites. Se Deus nos perdoa sempre, devemos agir também assim com os demais.

“Deus fez-se menino e este menino, uma vez adulto, deixou-se pregar na cruz. Não há nada mais fraco do que um homem crucificado, mas é naquela fraqueza que se manifestou a omnipotência de Deus”, finalizou Francisco, deixando os seus votos de gratidão, conversão e paz neste Natal.

VN

19 dezembro 2022

CONTO DE NATAL 2022


 
 
Aproximava-se o Natal e a inspiração não vinha.

Desde há mais de dez anos que em cada Natal escrevia um Conto que, volta e meia, relia e se espantava como tinha tido tal inspiração.

A verdade é que, normalmente, quando se aproximava o Natal, numa qualquer madrugada acordava às seis ou sete da manhã, (o que tantas vezes lhe acontecia), e, sem perceber como ou porquê, a história para o Conto surgia no seu coração, no seu pensamento.
Depois era só escrever, mais tarde, e ao tempo que escrevia iam surgindo as frases encadeadas.

Mas este ano, nada!
O tempo estava a acabar e nem uma “luzinha” sequer de uma qualquer ideia para o seu Conto de Natal de 2022.

Percorria na memória cenas bíblicas, histórias passadas, episódios natalícios, mas nada, nenhum desses pensamentos lhe transmitia aquela “segurança” que costumava sentir quando lhe vinha ao coração e ao pensamento a trave mestra de cada Conto de Natal.

Bem, pensou ele, chegou ao fim este ciclo de Contos de Natal.

Acabaram-se as ideias, acabaram-se as razões, ou, simplesmente, haverá outro modo de escrever sobre o Natal, porque a escrita para ele, era um contínuo processo em que as palavras iam aparecendo conforme escrevia.

“Arrumou” os pensamentos na “gaveta mental” dos Contos de Natal e decidiu procurar outro modo de escrever o Natal.

Naquela madrugada de 24 de Dezembro, mais uma vez, acordou às seis da manhã.
Seria para rezar, certamente, porque o Conto de Natal já estava “arrumado” na memória.

Foi então que ouviu dentro de si uma voz que lhe dizia.
Queres um Conto de Natal, Joaquim?

Ficou em silêncio com receio que aquele momento acabasse de repente, mas no seu coração apenas dizia sim, mil vezes sim.

Novamente ouviu, ou sentiu, no seu coração aquela voz que lhe disse:
Pois bem o teu Conto de Natal este ano, Joaquim, sou Eu!

És Tu, Senhor? - Perguntou sem perceber.

Sim, Joaquim, sou Eu!
O teu Conto de Natal este ano sou Eu naqueles que sofrem.
O teu Conto de Natal este ano sou Eu naqueles que nada têm.
O teu Conto de Natal este ano sou Eu naqueles que estão doentes.
O teu Conto de Natal este ano sou Eu naqueles que estão presos.
O teu Conto de Natal este ano sou Eu naqueles que estão em guerra.
O teu Conto de Natal este ano sou Eu naqueles que estão abandonados.
O teu Conto de Natal este ano sou Eu naqueles que estão desesperados.
O teu Conto de Natal este ano sou Eu naqueles que estão sós.
O teu Conto de Natal este ano sou Eu naqueles que são perseguidos.
O teu Conto de Natal este ano sou Eu naqueles que são ofendidos.
O teu Conto de Natal este ano sou Eu naqueles que estão traumatizados.
O teu Conto de Natal este ano sou Eu naqueles que não têm esperança.
O teu Conto de Natal este ano sou Eu naqueles que não têm amor.
O teu Conto de Natal este ano sou Eu naqueles que Me afastam.
O teu Conto de Natal este ano sou Eu naqueles que não acreditam.
O teu Conto de Natal este ano sou Eu naqueles que cantam, apesar de todas as dificuldades, «glória a Deus nas alturas e paz na terra aos homens de boa vontade.»

Abriu os olhos, sorriu, e disse numa prece do seu coração:
Que lindo Conto de Natal, Senhor! Só podia ser escrito por Ti!


 
Marinha Grande, 19 de Novembro de 2022
Joaquim Mexia Alves 


Com este Conto de Natal desejo a todos que visitam este espaço (https://queeaverdade.blogspot.com) um Santo Natal na alegria de Jesus Cristo Nosso Senhor!