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O Papa Francisco presidiu a Celebração da Penitência com o Ato de
Consagração ao Imaculado Coração de Maria, na Basílica de São Pedro, na
tarde desta sexta-feira (25/03), Solenidade da Anunciação do Senhor.
O Anjo Gabriel toma a palavra por três vezes para se dirigir à Virgem
Maria. "A primeira vez, quando a saúda com estas palavras: «Alegra-Te, ó
cheia de graça: o Senhor está contigo». O motivo para rejubilar, o
motivo da alegria, é desvendado em poucas palavras: o Senhor está
contigo", disse o Papa em sua homilia.
Segundo Francisco, "muitas vezes pensamos que a Confissão consiste em
ir de cabeça inclinada ao encontro de Deus. Mas voltar para o Senhor
não é primariamente obra nossa; é Ele que nos vem visitar, cumular da
sua graça, alegrar com o seu júbilo. Confessar-se é dar ao Pai a alegria
de nos levantar de novo. No centro daquilo que vamos viver, não estão
os nossos pecados, mas o seu perdão".
Restituamos à graça o primado e peçamos o dom de compreender que a
Reconciliação consiste antes de tudo, não num passo nosso para Deus,
mas no seu abraço que nos envolve, deslumbra, comove. É o Senhor que
entra em nossa casa, como na de Maria em Nazaré, e traz um
deslumbramento e uma alegria antes desconhecidos. Como primeiro plano
foquemos a perspectiva em Deus: voltaremos a gostar da Confissão.
Precisamos dela, porque cada renascimento interior, cada viragem
espiritual começa daqui, do perdão de Deus. Não negligenciemos a
Reconciliação, mas voltemos a descobri-la como o sacramento da alegria.
Sem qualquer rigidez, sem criar obstáculos nem incómodos; portas abertas
à misericórdia!
A segunda vez que o Anjo fala a Maria, perturbada com a saudação
recebida, é para Lhe dizer: «Não temas». Segundo Francisco, "na Sagrada
Escritura, quando Deus aparece, gosta de dirigir estas duas palavras a
quem O acolhe: não temas. Deste modo transmite-nos uma mensagem clara e
reconfortante: sempre que a vida se abre a Deus, o medo deixa de ter-nos
como reféns. A Virgem Maria nos acompanha: Ela mesma deixou a sua
perturbação em Deus. O anúncio do Anjo dava-Lhe razões sérias para não
temer. Propunha-Lhe algo de inimaginável, que estava para além das suas
forças e, sozinha, não poderia levá-lo para diante: haveria muitas
dificuldades, problemas com a lei mosaica, com José, com as pessoas da
sua terra e do seu povo. Mas Maria não levanta objeções. Basta-Lhe
aquele não temas, basta-Lhe a garantia de Deus. Agarra-Se a Ele, como
queremos nós fazer esta noite. Porque muitas vezes fazemos o contrário:
partimos das nossas certezas e, só quando as perdemos, é que vamos ter
com Deus. Nossa Senhora ensina-nos o contrário: partir de Deus, com a
confiança de que, assim, tudo o mais nos será dado. Convida-nos a ir à
fonte, ao Senhor, que é o remédio radical contra o medo e os perigos da
existência".
Nestes dias, notícias e imagens de morte continuam entrando dentro
de nossas casas, enquanto as bombas destroem as casas de muitos dos
nossos irmãos e irmãs ucranianos inermes. A guerra brutal, que se abateu
sobre tantos e que a todos faz sofrer, provoca em cada um medo e
consternação. Notamos dentro de nós uma sensação de impotência e
inadequação. Precisamos ouvir dizer-nos: «não temas». Mas não bastam as
garantias humanas, é necessária a presença de Deus, a certeza do perdão
divino, o único que apaga o mal, desativa o rancor, restitui a paz ao
coração. Voltemos a Deus, ao seu perdão.
Pela terceira vez, o Anjo retoma a palavra, para dizer a Nossa
Senhora: «O Espírito Santo virá sobre Ti». "É assim que Deus intervém na
história: dando o seu próprio Espírito. Porque nas coisas que contam,
não bastam as nossas forças. Por nós sozinhos somos incapazes de
resolver as contradições da história ou mesmo as do nosso coração.
Precisamos da força sapiente e suave de Deus, que é o Espírito Santo.
Precisamos do Espírito de amor, que dissolve o ódio, apaga o rancor,
extingue a ganância, desperta-nos da indiferença. Precisamos do amor de
Deus, porque o nosso amor é precário e insuficiente. Pedimos tantas
coisas ao Senhor, mas muitas vezes esquecemo-nos de Lhe pedir o que é
mais importante e que Ele nos deseja dar: o Espírito Santo, a força para
amar", frisou o Papa.
Segundo Francisco, "se quisermos que mude o mundo, tem de mudar
primeiro o nosso coração. Para o conseguirmos, deixemos hoje que Nossa
Senhora nos leve pela mão. Olhemos para o seu Imaculado Coração, onde
Deus descansou, para o único Coração de criatura humana sem sombras. Ela
é «cheia de graça» e, portanto, vazia de pecado: n’Ela não há vestígios
de mal e, assim, com Ela Deus pôde iniciar uma história nova de
salvação e de paz. Naquele ponto, a história deu uma virada. Deus mudou a
história, batendo à porta do Coração de Maria".
E hoje também nós, renovados pelo perdão de Deus, batemos à porta
daquele Coração. Em união com os Bispos e os fiéis do mundo inteiro,
desejo solenemente levar ao Imaculado Coração de Maria tudo o que
estamos vivendo: renovar-Lhe a consagração da Igreja e da humanidade
inteira e consagrar-Lhe de modo particular o povo ucraniano e o povo
russo, que, com afeto filial, a veneram como Mãe. Não se trata duma
fórmula mágica, mas dum ato espiritual. É o gesto da entrega plena dos
filhos que, na tribulação desta guerra cruel e insensata que ameaça o
mundo, recorrem à Mãe, lançando no seu Coração medo e sofrimento,
entregando-se a si mesmos. É colocar naquele Coração límpido,
incontaminado, onde Deus se espelha, os bens preciosos da fraternidade e
da paz, tudo o temos e somos, para que seja Ela – a Mãe que o Senhor
nos deu – a proteger-nos e guardar-nos.
Dos lábios de Maria brotou a frase mais bela que o Anjo pudesse
referir a Deus: «Faça-se em Mim segundo a tua palavra». "Esta aceitação
por parte de Nossa Senhora não é uma aceitação passiva nem resignada,
mas o desejo vivo de aderir a Deus, que tem «desígnios de paz e não de
desgraça». É a participação mais íntima no seu plano de paz para o
mundo. Consagramo-nos a Maria para entrar neste plano, para nos
colocarmos à inteira disposição dos desígnios de Deus. A Mãe de Deus,
depois de ter dito o seu sim, empreendeu uma longa viagem subindo até
uma região montanhosa para visitar a prima grávida. Hoje, que Ela tome
pela mão o nosso caminho e o guie, através das veredas íngremes e
cansativas da fraternidade e do diálogo, pela senda da paz", concluiu o
Papa.
A oração do ato de consagração
Ao final da da liturgia penitencial na Basílica de São Pedro, o Papa
pronuncia a seguinte oração para consagrar e confiar a humanidade, e
especialmente a Rússia e a Ucrânia, ao Imaculado Coração de Maria:
"Ó Maria, Mãe de Deus e nossa Mãe, recorremos a Vós nesta hora de
tribulação. Vós sois Mãe, amais-nos e conheceis-nos: de quanto temos no
coração, nada Vos é oculto. Mãe de misericórdia, muitas vezes
experimentamos a vossa ternura providente, a vossa presença que faz
voltar a paz, porque sempre nos guiais para Jesus, Príncipe da paz.
Mas perdemos o caminho da paz. Esquecemos a lição das tragédias do
século passado, o sacrifício de milhões de mortos nas guerras mundiais.
Descuidamos os compromissos assumidos como Comunidade das Nações e
estamos a atraiçoar os sonhos de paz dos povos e as esperanças dos
jovens. Adoecemos de ganância, fechamo-nos em interesses nacionalistas,
deixamo-nos ressequir pela indiferença e paralisar pelo egoísmo.
Preferimos ignorar Deus, conviver com as nossas falsidades, alimentar a
agressividade, suprimir vidas e acumular armas, esquecendo-nos que somos
guardiões do nosso próximo e da própria casa comum. Dilaceramos com a
guerra o jardim da Terra, ferimos com o pecado o coração do nosso Pai,
que nos quer irmãos e irmãs. Tornamo-nos indiferentes a todos e a tudo,
exceto a nós mesmos. E, com vergonha, dizemos: perdoai-nos, Senhor!
Na miséria do pecado, das nossas fadigas e fragilidades, no mistério
de iniquidade do mal e da guerra, Vós, Mãe Santa, lembrai-nos que Deus
não nos abandona, mas continua a olhar-nos com amor, desejoso de nos
perdoar e levantar novamente. Foi Ele que Vos deu a nós e colocou no
vosso Imaculado Coração um refúgio para a Igreja e para a humanidade.
Por bondade divina, estais connosco e conduzis-nos com ternura mesmo nos
transes mais apertados da história.
Por isso recorremos a Vós, batemos à porta do vosso Coração, nós os
vossos queridos filhos que não Vos cansais de visitar em todo o tempo e
convidar à conversão. Nesta hora escura, vinde socorrer-nos e
consolar-nos. Repeti a cada um de nós: «Não estou porventura aqui Eu,
que sou tua mãe?» Vós sabeis como desfazer os emaranhados do nosso
coração e desatar os nós do nosso tempo. Repomos a nossa confiança em
Vós. Temos a certeza de que Vós, especialmente no momento da prova, não
desprezais as nossas súplicas e vindes em nosso auxílio.
Assim fizestes em Caná da Galileia, quando apressastes a hora da
intervenção de Jesus e introduzistes no mundo o seu primeiro sinal.
Quando a festa se mudara em tristeza, dissestes-Lhe: «Não têm vinho!» (Jo 2,
3). Ó Mãe, repeti-o mais uma vez a Deus, porque hoje esgotamos o vinho
da esperança, desvaneceu-se a alegria, diluiu-se a fraternidade.
Perdemos a humanidade, malbaratamos a paz. Tornamo-nos capazes de toda a
violência e destruição. Temos necessidade urgente da vossa intervenção
materna.
Por isso acolhei, ó Mãe, esta nossa súplica:
Vós, estrela do mar, não nos deixeis naufragar na tempestade da guerra;
Vós, arca da nova aliança, inspirai projetos e caminhos de reconciliação;
Vós, «terra do Céu», trazei de volta ao mundo a concórdia de Deus;
Apagai o ódio, acalmai a vingança, ensinai-nos o perdão;
Libertai-nos da guerra, preservai o mundo da ameaça nuclear;
Rainha do Rosário, despertai em nós a necessidade de rezar e amar;
Rainha da família humana, mostrai aos povos o caminho da fraternidade;
Rainha da paz, alcançai a paz para o mundo.
O vosso pranto, ó Mãe, comova os nossos corações endurecidos. As
lágrimas, que por nós derramastes, façam reflorescer este vale que o
nosso ódio secou. E, enquanto o rumor das armas não se cala, que a vossa
oração nos predisponha para a paz. As vossas mãos maternas acariciem
quantos sofrem e fogem sob o peso das bombas. O vosso abraço materno
console quantos são obrigados a deixar as suas casas e o seu país. Que o
vosso doloroso Coração nos mova à compaixão e estimule a abrir as
portas e cuidar da humanidade ferida e descartada.
Santa Mãe de Deus, enquanto estáveis ao pé da cruz, Jesus, ao ver o discípulo junto de Vós, disse-Vos: «Eis o teu filho!» (Jo 19,
26). Assim Vos confiou cada um de nós. Depois disse ao discípulo, a
cada um de nós: «Eis a tua mãe!» (19, 27). Mãe, agora queremos
acolher-Vos na nossa vida e na nossa história. Nesta hora, a humanidade,
exausta e transtornada, está ao pé da cruz convosco. E tem necessidade
de se confiar a Vós, de se consagrar a Cristo por vosso intermédio. O
povo ucraniano e o povo russo, que Vos veneram com amor, recorrem a Vós,
enquanto o vosso Coração palpita por eles e por todos os povos ceifados
pela guerra, a fome, a injustiça e a miséria.
Por isso nós, ó Mãe de Deus e nossa, solenemente confiamos e
consagramos ao vosso Imaculado Coração nós mesmos, a Igreja e a
humanidade inteira, de modo especial a Rússia e a Ucrânia. Acolhei este
nosso ato que realizamos com confiança e amor, fazei que cesse a guerra,
providenciai ao mundo a paz. O sim que brotou do vosso Coração abriu as
portas da história ao Príncipe da Paz; confiamos que mais uma vez, por
meio do vosso Coração, virá a paz. Assim a Vós consagramos o futuro da
família humana inteira, as necessidades e os anseios dos povos, as
angústias e as esperanças do mundo.
Por vosso intermédio, derrame-se sobre a Terra a Misericórdia divina e
o doce palpitar da paz volte a marcar as nossas jornadas. Mulher do
sim, sobre Quem desceu o Espírito Santo, trazei de volta ao nosso meio a
harmonia de Deus. Dessedentai a aridez do nosso coração, Vós que «sois
fonte viva de esperança». Tecestes a humanidade para Jesus, fazei de nós
artesãos de comunhão. Caminhastes pelas nossas estradas, guiai-nos
pelas sendas da paz.
Amen."