29 junho 2021

Texto integral: Homilia da celebração dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo

 

  Solenidade dos Santos Apóstolos Pedro e Paulo  

 

HOMILIA DO PAPA FRANCISCO
Eucaristia, com a bênção dos pálios,
na Solenidade dos Apóstolos S. Pedro e S. Paulo
(Basílica de S. Pedro, 29 de junho de 2021)

 

Celebramos hoje a festa de dois grandes apóstolos do Evangelho e duas colunas angulares da Igreja: Pedro e Paulo. Observemos de perto estas duas testemunhas da fé: no centro da sua história, não está a própria destreza, mas o encontro com Cristo que lhes mudou a vida. Fizeram a experiência de um amor que os curou e libertou e, por isso, tornaram-se apóstolos e ministros de libertação para os outros.

Pedro e Paulo são livres unicamente porque foram libertados. Detenhamo-nos neste ponto central.

Pedro, o pescador da Galileia, foi libertado em primeiro lugar da sensação de ser inadequado e da amargura de ter falido, e isso verificou-se graças ao amor incondicional de Jesus. Embora fosse um hábil pescador, várias vezes experimentou, em plena noite, o sabor amargo da derrota por não ter pescado nada (cf. Lc 5, 5; Jo 21, 5) e, perante as redes vazias, sentiu a tentação do desânimo; apesar de forte e impetuoso, muitas vezes deixou-se tomar pelo medo (cf. Mt 14, 30); embora fosse um discípulo apaixonado do Senhor, continuou a pensar à maneira do mundo, sem conseguir entender e aceitar o significado da Cruz de Cristo (cf. Mt 16, 22); apesar de dizer-se pronto a dar a vida por Ele, bastou sentir-se suspeito de ser um dos Seus para se atemorizar chegando a negar o Mestre (cf. Mc 14, 66-72).

Mas Jesus amou-o desinteressadamente e apostou nele. Encorajou-o a não desistir, a lançar novamente as redes ao mar, a caminhar sobre as águas, a olhar com coragem para a sua própria fraqueza, a segui-Lo pelo caminho da Cruz, a dar a vida pelos irmãos, a apascentar as suas ovelhas. Deste modo libertou-o do medo, dos cálculos baseados apenas nas seguranças humanas, das preocupações mundanas, infundindo nele a coragem de arriscar tudo e a alegria de se sentir pescador de homens. Foi precisamente a ele que chamou para confirmar na fé os irmãos (cf. Lc 22, 32). Como ouvimos no Evangelho, deu-lhe as chaves para abrir as portas que levam a encontrar o Senhor e o poder de ligar e desatar: ligar os irmãos a Cristo e desatar os nós e as correntes das suas vidas (cf. Mt 16, 19).

Tudo isto só foi possível, porque antes, como nos dizia a primeira Leitura, Pedro foi libertado. As correntes que o mantêm prisioneiro são quebradas e, tal como aconteceu na noite da libertação dos israelitas da escravidão do Egito, é convidado a levantar-se depressa, colocar o cinto e calçar as sandálias para sair. E o Senhor abre as portas diante dele (cf. At 12, 7-10). É uma nova história de abertura, de libertação, de correntes quebradas, de saída do cárcere que o prende. Pedro faz a experiência da Páscoa: o Senhor libertou-o.

Também o apóstolo Paulo experimentou a libertação por obra de Cristo. Foi libertado da escravidão mais opressiva, a de si mesmo, e de Saulo – nome do primeiro rei de Israel – tornou-se Paulo, que significa «pequeno». Foi libertado também daquele zelo religioso que o tornara fanático na defesa das tradições recebidas (cf. Gal 1, 14) e violento ao perseguir os cristãos. A observância formal da religião e a defesa implacável da tradição, em vez de o abrir ao amor de Deus e dos irmãos, tinham-no endurecido. Foi disto que Deus o libertou; ao invés, não o poupou a tantas fraquezas e dificuldades que tornaram mais fecunda a sua missão evangelizadora: as canseiras do apostolado, a enfermidade física (cf. Gal 4, 13-14); as violências e perseguições, os naufrágios, a fome e sede, e – segundo as suas próprias palavras – um espinho que o atormentava na carne (cf. 2 Cor 12, 7-10).

Paulo compreendeu assim que «o que há de fraco no mundo é o que Deus escolheu para confundir o que é forte» (1 Cor 1, 27), que tudo podemos n’Ele que nos dá força (cf. Flp 4, 13), que nada poderá, jamais, separar-nos do seu amor (cf. Rm 8, 35-39). Por isso, no final da sua vida, como nos dizia a segunda Leitura, Paulo pode dizer: «o Senhor esteve comigo» e «livrar-me-á de todo o mal» (2 Tm 4, 17.18). Paulo fez a experiência da Páscoa: o Senhor libertou-o.

Queridos irmãos e irmãs, a Igreja olha para estes dois gigantes da fé e vê dois Apóstolos que libertaram a força do Evangelho no mundo, só porque antes foram libertados pelo encontro com Cristo. Ele não os julgou, nem humilhou, mas partilhou de perto e afetuosamente a sua vida, sustentando-os com a sua própria oração e, às vezes, admoestando-os para os impelir à mudança. A Pedro, disse Jesus com ternura: «Eu roguei por ti, para que a tua fé não desapareça» (Lc 22, 32); a Paulo, pergunta: «Saulo, Saulo, porque Me persegues?» (At 9, 4). De igual modo procede Jesus também connosco: assegura-nos a sua proximidade, rezando por nós e intercedendo junto do Pai; e repreende-nos com doçura quando erramos, para podermos encontrar a força de nos levantar novamente e retomar o caminho.

Tocados pelo Senhor, também somos libertados. E temos sempre necessidade de sermos libertados, porque só uma Igreja liberta é uma Igreja credível. Como Pedro, somos chamados a ser libertos da sensação da derrota face à nossa pesca por vezes mal sucedida; a ser libertos do medo que nos paralisa e nos torna medrosos, fechandos nas nossas seguranças e tirando-nos a coragem da profecia. Como Paulo, somos chamados a ser libertos das hipocrisias da exterioridade; libertos da tentação de nos impormos com a força do mundo, e não com a debilidade que deixa espaço a Deus; libertos duma observância religiosa que nos torna rígidos e inflexíveis; libertos de vínculos ambíguos com o poder e do medo de ser,os incompreendidos e atacados.

Pedro e Paulo oferecem-nos a imagem duma Igreja confiada às nossas mãos, mas conduzida pelo Senhor com fidelidade e ternura; duma Igreja débil, mas forte com a presença de Deus; duma Igreja libertada que pode oferecer ao mundo aquela libertação que ele, sozinho, não se pode dar a si mesmo: a libertação do pecado, da morte, da resignação, do sentimento da injustiça, da perda da esperança que embrutece a vida das mulheres e dos homens do nosso tempo.

Interroguemo-nos: quanta necessidade de libertação têm as nossas cidades, as nossas sociedades, o nosso mundo? Quantas correntes devem ser quebradas e quantas portas trancadas devem ser abertas! Podemos ser colaboradores desta libertação, mas só se, primeiro, deixarmo-nos libertar pela novidade de Jesus e caminharmos na liberdade do Espírito Santo.

Hoje os nossos irmãos Arcebispos recebem o Pálio. Este sinal de unidade com Pedro recorda a missão do pastor que dá a vida pelo rebanho. É dando a vida que o Pastor, liberto de si mesmo, se torna instrumento de libertação para os irmãos. Hoje temos connosco a Delegação do Patriarcado Ecuménico, enviada para esta ocasião pelo querido irmão Bartolomeu: a vossa amável presença é um sinal precioso de unidade no caminho da libertação das distâncias que, escandalosamente, dividem os crentes em Cristo.

Rezamos por vós, pelos Pastores, pela Igreja, por todos nós: para que, libertados por Cristo, possamos ser apóstolos de libertação em todo o mundo.

VN

27 junho 2021

Papa Francisco, Angelus: a maior doença da vida é a falta de amor

 
 
 Papa Francisco durante o Angelus no Vaticano  (Vatican Media) 
 
Neste domingo Francisco rezou a oração mariana do Angelus com os fiéis reunidos na Praça de  S. Pedro. "Hoje, no Evangelho, Jesus depara-se com as nossas duas situações mais dramáticas, morte e doença”, disse o Papa.
 

Silvonei José – Vatican News

"A maior doença da vida é a falta de amor, é não ser capaz de amar. E a cura mais importante é a dos afetos". Estas são palavras pronunciadas pelo Papa Francisco antes da oração mariana do Angelus ao meio-dia deste 13º Domingo do Tempo Comum, assomando à janela do seu escritório no Palácio Apostólico Vaticano, diante dos fiéis e peregrinos reunidos na Praça de S. Pedro.

"Hoje, no Evangelho, Jesus depara-se com as nossas duas situações mais dramáticas, morte e doença”, disse o Papa. Delas ele liberta duas pessoas: uma menina, que morre enquanto o pai foi pedir ajuda a Jesus; e uma mulher, que perde sangue há muitos anos. Jesus deixa-se tocar pela nossa dor e morte, e realiza dois sinais de cura para nos dizer que nem a dor nem a morte têm a última palavra. Ele  diz-nos que a morte não é o fim. Ele vence este inimigo, do qual não nos podemos libertar sozinhos”.

 

 Fiéis na Praça de S. Pedro durante o Angelus 

 

"A história desta mulher sem nome, na qual todos nós nos podemos ver, é exemplar", explicou o Papa Francisco. O texto diz que ela tinha feito muitas curas, "gastando todos os seus bens sem nenhuma vantagem", ao contrário, piorando".  "A maior doença da vida é o câncer, a tuberculose, a pandemia? Não... disse o Papa. É a falta de amor é não conseguir amar. Esta pobre mulher estava doente pela falta de amor. E a cura mais importante é a dos afetos", disse Bergoglio.

“Também nós, quantas vezes nos lançamos em remédios errados para satisfazer a nossa falta de amor”. “Pensamos que nos faz felizes. o sucesso e o dinheiro, mas o amor não se compra é gratuito. Refugiamo-nos no virtual, mas o amor é concreto. Nós não nos aceitamos como somos e escondemo-nos por detrás dos truques da exterioridade, mas o amor não é aparência. Procuramos soluções em magos e gurus, para depois nos encontrarmos sem dinheiro e sem paz”.

No entanto "refugiamo-nos no virtual, mas o amor é concreto", continuou o Papa.

 

 

Francisco disse ainda que muitas vezes “gostamos de ver as coisas más das outras pessoas. Quantas vezes caímos na tagarelice, que é mexericar sobre os outros. Que horizonte de vida é este"? "Não julgue a realidade pessoal e social dos outros", reiterou ele, "não julgue e deixe os outros viverem". "Olhe em seu redor: e verá que tantas pessoas que vivem ao seu lado sentem-se feridas e sozinhas, elas precisam de se sentir amadas. Dê o passo. Jesus lhe te pede um olhar que não se detém na exterioridade, mas vai ao coração; um olhar que não julga, deixemos de julgar os outros, Jesus nos pede-nos um olhar que não julga, mas acolhedor. Porque só o amor cura a vida. Que Nossa Senhora, finalizou o Papa Francisco, consoladora dos aflitos, nos ajude a levar uma caricia aos feridos no coração que encontramos np nosso caminho".

 

VN

25 junho 2021

O Papa aos luteranos: Jesus acompanha-nos no caminho do conflito, à comunhão

 

 Momento  de oração ecuménica na Catedral de Lund, durante a viagem apostólica do Papa à Suécia 

 
Durante o encontro com os representantes da Federação Luterana Mundial, Francisco encorajou "todos aqueles que estão comprometidos com o diálogo católico-luterano a prosseguirem com confiança na oração incessante, no exercício da caridade partilhada e na paixão pela pricuaa de uma maior unidade".
 

Mariangela Jaguraba - Vatican News

O Papa Francisco recebeu em audiência, nesta sexta-feira (25/06), no Vaticano, uma delegação da Federação Luterana Mundial. O Pontífice recordou a sua visita a Lund, cidade onde a Federação foi fundada, no âmbito de sua viagem apostólica à Suécia, em 2016.

"Naquela inesquecível etapa ecuménica, experimentamos a força evangélica da reconciliação, atestando que «através do diálogo e do testemunho compartilhado de, não somos mais estranhos». Não mais estranhos, mas irmãos", frisou o Papa.

"No caminho do conflito à comunhão, no dia da comemoração da Confessio Augustana, vós viestes a Roma para que cresça a unidade entre nós", disse Francisco, desejando que "a reflexão comum sobre o Confessio Augustana, com base nos 500 anos da sua leitura, em 25 de junho de 2030, "traga benefício ao caminho ecuménico". "Na época, a Confessio Augustana foi uma tentativa de neutralizar a ameaça de uma divisão no cristianismo ocidental", recordou o Pontífice, lembrando que, em 1980, por ocasião dos 450 anos desse texto, luteranos e católicos afirmaram: «O que reconhecemos na Confessio Augustana como fé comum pode-nos ajudar a confessar esta fé, juntos, de ima maneira nova também em relação ao nosso tempo». Confessar juntos o que temos em comum na fé". Francisco recordou "as palavras do Apóstolo Paulo na Carta aos Efésios: "Um só corpo, [...] um só batismo. Um só Deus".

Um só Deus

Segundo o Papa, "no primeiro artigo, a Confessio Augustana professa a fé no Deus Uno e Trino, referindo-se ao Concílio de Nicéia".

O credo de Nicéia é uma expressão vinculante de fé não só para católicos e luteranos, mas também para os irmãos ortodoxos e para muitas outras comunidades cristãs. É um tesouro comum: trabalhemos para que o aniversário de 1.700 anos daquele grande Concílio, que se realizará em 2025, possa dar um novo impulso ao caminho ecuménico, que é um dom de Deus e um percurso irreversível para nós.

Um só batismo

Segundo o Papa, "tudo aquilo que a graça de Deus nos dá a alegria de experimentar e partilhar, a crescente superação das divisões, a cura progressiva da memória, a colaboração reconciliada e fraterna entre nós, encontra seu fundamento no "único batismo para a remissão dos pecados".

O santo batismo é o dom divino original, que está na base de todo nosso esforço religioso e de todo compromisso para alcançar a unidade plena. Sim, porque o ecumenismo não é um exercício de diplomacia eclesial, mas um caminho de graça. Ele não se apoia em mediações e acordos humanos, mas na graça de Deus, que purifica a memória e o coração, vence a rigidez e se orienta para uma comunhão renovada: não para acordos diminutivos ou sincretismos conciliantes, mas para uma unidade reconciliada nas diferenças. Nesta perspectiva, gostaria de encorajar todos aqueles que estão envolvidos no diálogo católico-luterano a prosseguir com confiança na oração incessante, no exercício da caridade partilhada e na paixão pela busca de uma maior unidade entre os vários membros do Corpo de Cristo.

Um só corpo

"Um só corpo. A este propósito a Regra de Taizé contém uma exortação bonita", frisou o Papa: "«Tenham a paixão pela unidade do Corpo de Cristo». A paixão pela unidade amadurece através do sofrimento que se sente diante das feridas que infligimos ao Corpo do Senhor".

Quando sentimos dor pela divisão dos cristãos, aproximamo-nos do que Jesus experimenta, continuando a ver os seus discípulos desunidos, as suas vestes rasgadas. Hoje, vocês me deram uma patena e um cálice provenientes das oficinas de Taizé. Agradeço-lhes por estes dons, que evocam a nossa participação na Paixão do Senhor. Na verdade, também nós vivemos uma certa paixão, em seu duplo significado: por um lado, o sofrimento, porque ainda não é possível nos reunirmos em torno do mesmo altar; de outro, o ardor em servir à causa da unidade, pela qual o Senhor rezou e ofereceu sua vida.

Por fim, o Papa exortou a prosseguir "com paixão em nosso caminho do conflito à comunhão".

A próxima etapa será compreender os estreitos laços entre Igreja, ministério e Eucaristia. Será importante olhar com humildade espiritual e teológica para as circunstâncias que levaram às divisões, confiando que embora seja impossível anular os tristes acontecimentos do passado, é possível relê-los dentro de uma história reconciliada. A sua Assembleia Geral em 2023 poderá ser um passo importante para purificar a memória e valorizar muitos tesouros espirituais que o Senhor estabeleceu para todos durante os séculos. Queridos irmãos e irmãs, o percurso que vai do conflito à comunhão não é fácil, mas não estamos sozinhos: Cristo nos acompanha.

Arcebispo Musa: a reconciliação tem o rosto de Jesus

As palavras do Papa Francisco foram precedidas pelas do arcebispo Panti FIlibus Musa, presidente da Federação Luterana Mundial. “Para nós a reconciliação tem um rosto: Jesus Cristo, e com Jesus o rosto do nosso próximo. O amor de Deus nos orienta para o próximo, a fé se torna ativa no amor. No encontro com os pobres e com os esquecidos e explorados pelo mundo, descobrimos que Cristo vem ao nosso encontro, nos alcança e nos torna uma só coisa”. “Luteranos e católicos procuram compreender hoje, globalmente, como viver a vontade de Deus que nos torna um”.

VN

23 junho 2021

Papa: o caminho libertador de Jesus é a resposta aos "guardiães" da verdade

 


Uma série de catequeses inspiradas na Carta aos Gálatas: foi o anúncio hoje do Papa Francisco na Audiência Geral. Na semana passada, o Pontífice concluiu o ciclo sobre a oração, ao qual dedicou 38 catequeses. "Espero que com este itinerário de oração tenhamos conseguido rezar melhor."

Bianca Fraccalvieri – Cidade do Vaticano

Quarenta minutos: este foi o tempo que o Papa Francisco dedicou a cumprimentar e saudar os fiéis e peregrinos cada vez mais numerosos no Pátio de S. Dâmaso, onde se realiza a Audiência Geral. Não obstante o calor, Francisco não deixou de fazer brincadeiras, ouvir confidências, assinar teses e livros e abençoar quem se aperta para ter pelo menos um segundo da atenção do Papa.

Já diante do microfone, o Pontífice iniciou um novo ciclo de catequeses. O tema agora será inspirado no apóstolo Paulo, mais precisamente na Carta aos Gálatas.

 É uma Carta muito importante, diria até decisiva, não só para conhecer melhor o Apóstolo, mas sobretudo para considerar alguns dos temas que ele aborda em profundidade, mostrando a beleza do Evangelho. Parece escrita para os nossos tempos”, explicou o Pontífice.

As primeiras comunidades cristãs

Entre os temas a serem explorados nas próximas semanas, estão a conversão, a liberdade, a graça e o modo de vida cristão, mas a primeira temática abordada por Francisco foi a obra de evangelização realizada pelo Apóstolo, que visitou as comunidades da Galácia pelo menos duas vezes durante as suas viagens missionárias.

Sabe-se que os gálatas eram uma antiga população celta que, através de muitas vicissitudes, se estabeleceu na extensa região da Anatólia que tinha a sua capital na cidade de Ancira, hoje Ankara, capital da Turquia.

Paulo relata apenas que, por causa de uma doença, viu-se obrigado a permanecer naquela região - facto que indica que o caminho da evangelização nem sempre depende da nossa vontade e dos nossos projetos, mas requer a disponibilidade nos deixamos plasmar e seguir outros caminhos que não estavam previstos.

A chegada dos "abutres"

Para o Papa, é interessante notar a preocupação pastoral de Paulo, pois havia muitos infiltrados a semear teorias contrárias aos seus ensinamentos, chegando ao ponto de o difamar. Como alguém dizia, notou o Pontífice, "vêm os abutres a destruir a comunidade".

“Como podemos ver, é uma prática antiga apresentar-se em certas ocasiões como o único possuidor da verdade e procurar menosprezar o trabalho dos outros, até com a calúnia”, afirmou.

Entre as intrigas, os adversários argumentaram que os Gálatas teriam de renunciar à sua identidade cultural e os mesmos encontravam-se numa situação de crise. Para eles, que conheceram Jesus e acreditaram na obra de salvação realizada através da sua morte e ressurreição, foi verdadeiramente o início de uma nova vida, mas sentiam-se desorientados e incertos sobre como se comportar e a quem ouvir.

“Pensemos em alguma comunidade cristã ou diocese: começam as histórias e depois acabam por desacreditar o pároco, o bispo. É precisamente o caminho do maligno, dessas pessoas que dividem e não sabem construir. E nesta Carta aos Gálatas vemos este procedimento.”

Uma situação que se apresenta também hoje, constatou Francisco:

“Ainda hoje, não faltam pregadores que, especialmente através dos novos meios de comunicação, se apresentam não para anunciar o Evangelho de Deus que ama o homem em Jesus Crucificado e Ressuscitado, mas para reiterar com insistência, como verdadeiros ‘guardiães da verdade’, qual é a melhor maneira de ser cristão.”

A liberdade oferecida por Cristo

Estas pessoas afirmam que o verdadeiro cristianismo é aquele a que estão ligados, frequentemente identificado com certas formas do passado, e que a solução para as crises de hoje é voltar atrás para não perder a genuinidade da fé. Também hoje, como outrora, existe a tentação de nos fecharmos em algumas certezas adquiridas em tradições passadas.

O traço distintivo dessas pessoas, segundo o Papa, é a rigidez: "Diante da pregação do Evangelho que nos torna livres, nos faz-nos alegres, estes são rígidos".

Mas é o próprio Apóstolo que indica o caminho a seguir, e é o caminho libertador e sempre novo de Jesus Crucificado e Ressuscitado; é o caminho do anúncio, que se realiza através da humildade e da fraternidade; "os novos pregadores não conhecem o significado da humildade, da fraternidade"; é o caminho da confiança mansa e obediente, que os novos pregadores não conhecem, na certeza de que o Espírito Santo age em cada época da Igreja. "Em última instância, a fé no Espírito Santo presente na Igreja leva-nos por diante e nos salvará."

VN

22 junho 2021

Papa aos Idosos: salvaguardar as raízes, transmitir a fé aos jovens e cuidar dos pequeninos

 

 

“Não existe uma idade para nos aposentarmos da tarefa de anunciar o Evangelho, da tarefa de transmitir as tradições aos netos. É preciso pôr--mo-nos a caminho e, sobretudo, sair de nós mesmos para empreender algo de novo”. Assim falou o Papa Francisco na sua Mensagem para o Dia Mundial dos Avós e dos Idosos que será celebrado no dia 25 de julho próximo
 

Jane Nogara - Vatican News

Na manhã desta terça-feira (22) foi divulgada a mensagem do Papa Francisco para o Dia Mundial dos Avós e dos Idosos que será celebrado no 4° domingo de julho, neste ano, no dia 25. O Papa Francisco escreveu a sua mensagem colocando-se lado a lado com os idosos, e iniciou afirmando: 

“’Eu estou contigo todos os dias’ (cf. Mt 28, 20) é a promessa que o Senhor fez aos discípulos antes de subir ao Céu; e hoje repete-a também a ti, querido avô e querida avó. Sim, a ti! ‘Eu estou contigo todos os dias’ são também as palavras que eu, Bispo de Roma e idoso como tu, gostaria de te dirigir por ocasião deste primeiro Dia Mundial dos Avós e dos Idosos: toda a Igreja está solidária contigo – ou melhor, connosco –, preocupa-se contigo, ama-te e não quer deixar-te abandonado”.

Depois de ter recordado as perdas e sofrimentos por causa da pandemia o Papa consolou:

“O Senhor conhece cada uma das nossas tribulações deste tempo. Ele está junto de quantos vivem a dolorosa experiência de ter sido afastado; a nossa solidão – agravada pela pandemia – não O deixa indiferente”

Francisco explica o motivo pelo qual proclamou justamente neste ano o Dia Mundial dos Avós e dos Idosos:

“Mesmo quando tudo parece escuro, como nestes meses de pandemia, o Senhor continua a enviar anjos para consolar a nossa solidão repetindo-nos: ‘Eu estou contigo todos os dias’. Di-lo a ti, di-lo a mim, a todos. Está aqui o sentido deste Dia Mundial que eu quis celebrado pela primeira vez precisamente neste ano, depois dum longo isolamento e com uma retomada ainda lenta da vida social: oxalá cada avô, cada idoso, cada avó, cada idosa – especialmente quem dentre vós está mais sozinho – receba a visita de um anjo!”.

Os anjos que ajudam

O Papa recorda que o “anjo enviado por Deus, pode ter o rosto de um familiar, de um conhecido”, mas o Senhor “envia-nos os seus mensageiros também através da Palavra divina, que Ele nunca deixa faltar na nossa vida. Cada dia, leiamos uma página do Evangelho, rezemos com os Salmos, leiamos os Profetas! Ficaremos comovidos com a fidelidade do Senhor”.

Idosos evangelizadores

E alerta os idosos:

“Atenção! Qual é a nossa vocação hoje, na nossa idade? Salvaguardar as raízes, transmitir a fé aos jovens e cuidar dos pequeninos. Não vos esqueçais disto”

E reitera: “Não existe uma idade para te aposentares da tarefa de anunciar o Evangelho, da tarefa de transmitir as tradições aos netos. É preciso pores-te a caminho e, sobretudo, sair de tii mesmo para empreenderes algo de novo”. Francisco recorda também que alguns idosos podem até afirmar que não têm condições por um motivo ou outro, porém logo encorajou-os: “Isso é possível – responde o Senhor –, abrindo o próprio coração à obra do Espírito Santo, que sopra onde quer. Com a liberdade que tem, o Espírito Santo move-Se por toda a parte e faz aquilo que quer”.

E citou mais uma vez palavras que já afirmara noutras ocasiões: “Da crise que o mundo atravessa, não sairemos iguais: sairemos melhores ou piores”. “Ninguém se salva sozinho. Devedores uns dos outros. Todos irmãos”.

Três pilares para a nova construção

“Nesta perspetiva – continua o Papa - quero dizer que há necessidade de ti para se construir, na fraternidade e na amizade social, o mundo de amanhã: aquele em que viveremos – nós com os nossos filhos e netos –, quando se aplacar a tempestade. Todos devemos ser ‘parte ativa na reabilitação e apoio das sociedades feridas’”. E sugere três pilares sobre os quais sustentar esta nova construção: os sonhos, a memória e a oração". E explica:

“A proximidade do Senhor dará – mesmo aos mais frágeis de nós – a força para empreender um novo caminho pelas estradas do sonho, da memória e da oração”

Aliança entre jovens e idosos

Ao falar sobre sonhos dos idosos e visões dos jovens o Pontífice ponderou: “O futuro do mundo está na aliança entre os jovens e os idosos. Quem, senão os jovens, pode agarrar os sonhos dos idosos e levá-los por diante? Mas, para isso, é necessário continuar a sonhar: nos nossos sonhos de justiça, de paz, de solidariedade reside a possibilidade dos nossos jovens terem novas visões e, juntos, construirmos o futuro. É preciso que testemunhes, também tu, a possibilidade de se sair renovado duma experiência dolorosa”.

Recordar é viver

Francisco leva o seu pensamento também ao entrelaçamento entre sonhos e memória e afirma: “Penso como pode ser de grande valor a memória dolorosa da guerra, e quanto podem as novas gerações aprender dela a respeito do valor da paz”. “Recordar é uma missão verdadeira e própria de cada idoso: conservar na memória e levar a memória aos outros” afirma o Papa. Depois de recordar Edith Bruck sobrevivente do Holocausto que afirmou, ‘mesmo que seja para iluminar uma só consciência, vale a pensa a fadiga de manter a recordação do que foi.... para mim recordar é viver’, o Papa continua encorajando mais uma vez: “Penso também nos meus avós e naqueles de vós que tiveram de emigrar e sabem quanto custa deixar a própria casa, como fazem muitos ainda hoje à procura dum futuro. Talvez tenhamos algum deles ao nosso lado a cuidar de nós. Esta memória pode ajudar a construir um mundo mais humano, mais acolhedor. Mas, sem a memória, não se pode construir; sem alicerces, tu nunca construirás uma casa. Nunca. E os alicerces da vida estão na memória”.

A Oração

Por fim, a oração. “A tua oração é um recurso preciosíssimo: é um pulmão de que não se podem privar a Igreja e o mundo", disse o Papa. "Sobretudo neste tempo tão difícil para a humanidade em que estamos – todos na mesma barca – a atravessar o mar tempestuoso da pandemia, a tua intercessão pelo mundo e pela Igreja não é vã, mas indica a todos a serena confiança de um porto seguro”.

O Papa Francisco conclui a sua mensagem com um auspício: “ Oxalá cada um de nós aprenda a repetir a todos, e em particular aos mais jovens, estas palavras de consolação que ouvimos hoje dirigidas a nós: ‘Eu estou contigo todos os dias’. Avante e coragem! Que o Senhor vos abençoe”.

VN

21 junho 2021

A OUTRA MARGEM

 


 

 

No Evangelho de ontem Jesus convida-nos a passar à outra margem.

Naquele dia, ao cair da tarde, Jesus disse aos seus discípulos: «Passemos à outra margem do lago». Mc 4, 35

Depois da Missa e da homilia, fiquei a pensar na “passagem para a outra margem”.

Há tantas margens em que estamos e nos sentimos seguros, e há tantas margens a que somos convidados a passar e que nos tiram do nosso conforto, da nossa rotina, dos nossos hábitos.

Entre todas essas margens em que estamos e as outras a que devemos passar, pensei na “margem da oração”.

Estamos habituados à oração das “orações já feitas”, (e ainda bem que estamos), às mesmas orações e esquema de oração que fazemos todos os dias, (e mais uma vez, ainda bem que estamos), estamos até habituados a pedir aos outros para rezarem por nós, (e ainda bem que o pedimos), e tantas outras coisas que poderíamos rever nesta “margem da oração”.

Mas o “passar à outra margem”, não significa que esta margem seja má ou não seja uma boa margem, nem sequer que devemos esquecer esta margem ou que a ela não possamos voltar de quando em vez.

Significa, julgo eu, Jesus a chamar-nos a descobrir as “coisas novas” que Ele sempre nos dá quando O queremos seguir em tudo e em todos os momentos.

E esta outra “margem da oração” quer levar-nos a descobrir a oração que o Espírito Santo faz em nós, se O deixarmos.

A oração espontânea, a oração das palavras soltas dirigidas a Deus, mais do que escolhidas e pensadas para “agradar-Lhe”.

A oração que se extasia com o belo que Deus coloca nas nossas vidas e que até se pode constituir, não em palavras ditas, mas interjeições e exclamações de espanto alegre.

A oração que faz movimentar o nosso todo, o nosso ser, que nos faz levantar as mãos para Deus, que faz erguer o nosso coração ao Céu, que abre na nossa boca o sorriso que brilha nos nossos olhos, quando nos sentimos tocados por Deus, quando vemos os sinais de Deus.

Mas para passar a esta outra “margem da oração”, por vezes, é preciso arrostar com tempestades, ventos contrários, temores e receios, que são muitas vezes a “secura de oração”, o não ter palavras para dizer, o nada sentir, o parecer que estamos sós.

Mas é então que Ele nos responde: «Porque estais tão assustados? Ainda não tendes fé?».

E, com certeza, acrescenta baixinho ao nosso coração: “Abandona-te ao Espírito Santo. Ele está contigo e colocará no teu coração, na tua boca, as palavras que Me hás-de querer dizer!”

Então acalmam-se as tempestades, cessam os ventos, faz-se a paz dentro de nós e tudo em nós é oração, às vezes mesmo sem dizer palavras.

Não esperemos mais e passemos à “outra margem”, levando connosco tudo o que aprendemos e vivemos de bom na margem em que estamos.

 

Marinha Grande, 21 de Junho de 2021

Joaquim Mexia Alves

 

20 junho 2021

O Papa: acreditar no poder suave e extraordinário da oração

 

 

No Angelus deste domingo, 20 de junho, o Papa destacou que não devemos deixar de procurar o Senhor, bater na porta do Seu Coração nos nossos momentos de aflição e acreditar no poder suave e extraordinário da oração que faz milagres 
 

Jane Nogara - Vatican News

Na oração mariana do Angelus deste domingo (20), o Papa Francisco falou sobre o texto do Evangelho de Marcos, no qual Jesus com os discípulos no barco, acalmou a tempestade. No texto, os discípulos são deixados levar pelo medo, assustados, olhando as violentas ondas e ficam perplexos ao ver Jesus, na popa, dormindo sobre um travesseiro. E gritam-lhe: “Mestre, não te importas que pereçamos?”.

Partindo da atitude dos discípulos, o Papa Francisco recorda-nos: “Muitas vezes nós também, assaltados pelas provações da vida, gritamos ao Senhor: ‘Porque ficas em silêncio e não fazes nada por mim?’". Devemo-nos lembrar, continua o Papa que “apesar de estar a dormir, Jesus está lá e compartilha com os seus discípulos tudo o que está a acontecer. O seu sono, se por um lado nos surpreende, por outro, põe-nos à prova”. E explica:

“O Senhor, de facto, espera que o envolvamos, que o invoquemos, que o coloquemos no centro do que vivemos. O seu sono provoca-nos a acordar. Porque, para ser discípulos de Jesus não basta crer que Deus está presente, que existe, mas é preciso envolver-mo-nos com Ele, é preciso também levantar a nossa voz com Ele, gritar-Lhe”

Chamar Deus através da oração

Francisco continua: “O Evangelho diz-nos que os discípulos aproximam-se de Jesus, acordam-no e falam com ele”. Este é o começo de nossa fé:

“Reconhecer que sozinhos não somos capazes de permanecer à tona. A fé começa com a crença de que não somos suficientes para nós mesmos, com o sentimento de necessidade de Deus”

"Quando superamos a tentação de nos fecharmos em nós mesmos - continua o Papa - quando superamos a falsa religiosidade que não quer perturbar Deus, quando clamamos-Lhe, Ele pode fazer maravilhas em nós. É o poder suave e extraordinário da oração que faz milagres".

Olhar na direção certa

Depois de Jesus perguntar aos discípulos: 'Porque tendes medo? Ainda não tendes fé'? damos conta de que devemos olhar para Jesus e não deixarmo-nos levar pelo medo.  E Francisco conclui:

“Quantas vezes ficamos a olhar para os problemas em vez de irmos ao Senhor e lançarmos as nossas preocupações n’Ele! Quantas vezes deixamos o Senhor num canto, no fundo do barco da vida, para despertá-lo apenas no momento da necessidade!”

Por fim o Papa pede: “não cansemos de procurar o Senhor, de bater na porta do Seu Coração”, desejando ainda, "Que a Virgem Maria, que na sua vida, nunca deixou de confiar em Deus, redescubra em nós a necessidade vital de nos confiarmos a Ele todos os dias".

VN

19 junho 2021

Sínodo Diocesano 2016 - Documento final da caminhada sinodal de Lisboa (2014-2021)

 


O sonho missionário de chegar a todos

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Para acesso ao:

Documento final da caminhada sinodal de Lisboa (2014-2021)

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Palavras conclusivas do Sínodo Diocesano de Lisboa

 

 
 

Concluímos o Sínodo Diocesano de Lisboa (2014-2021), em que quisemos corresponder ao apelo do Papa Francisco na exortação apostólica Evangelii Gaudium: «Na sua missão de promover uma comunhão dinâmica, aberta e missionária, deverá [o Bispo] estimular e procurar o amadurecimento dos organismos de participação propostos pelo Código de Direito Canónico e de outras formas de diálogo pastoral […]. Mas o objetivo destes processos participativos não há de ser principalmente a organização eclesial, mas o sonho missionário de chegar a todos» (nº 31). 

Na sua exortação inaugural, o Papa pediu-nos uma verdadeira “conversão”, que nos faça reencontrar sempre mais como Igreja em saída missionária. Em Cristo e no Espírito de Cristo, saímos de nós para o Pai, em louvor, e para o mundo, em testemunho evangélico. É a nossa marca identitária, como Povo de Deus que só assim se define e caminha. Aliás, nada nos pode unir tanto como a missão comum. Creio que estes sete anos sinodais nos ajudaram a compreendê-lo ainda melhor.
Foi assim que dedicámos cinco trimestres à sequência dos capítulos da Evangelii Gaudium. Foram milhares os diocesanos que participaram em encontros e grupos sinodais e muitas as reflexões e sugestões que compartilharam. Foram depois reunidas no documento que serviu de base à assembleia de novembro-dezembro de 2016, quando também comemorámos a qualificação pastoral “patriarcal” de Lisboa, igualmente evocada em sentido missionário. Tudo isto confluiu na Constituição Sinodal de Lisboa.
Prosseguimos com a sua receção sistemática, em torno de quatro números axiais, sobre a Palavra de Deus onde nasce a fé, a Liturgia que nos faz encontrar com Deus e os outros, a Caridade que centraliza as periferias e a relação fraterna e corresponsável que há de caraterizar a comunidade cristã.
Agradeço vivamente ao Cónego Rui Pedro e a quantos com ele colaboraram no Secretariado do Sínodo Diocesano, pelo excelente trabalho feito em todo o percurso de receção e avaliação. Além dos departamentos diocesanos a que cada ano mais se referiu, destaco os Padres Tiago Neto, Ricardo Figueiredo e Bernardo Trocado, além do Diácono António Matos. Também o apoio técnico dos seminaristas Afonso Sousa, Diogo Tomás e Pedro Sousa. E o Departamento de Comunicação do Patriarcado, com o Padre Nuno Fernandes, o Filipe Teixeira e o Diogo Paiva Brandão – sem esquecer a Agência Ecclesia. Muito obrigado a todos! Saibamos dar continuação ao que melhor resultou, com o hábito reforçado de trabalharmos juntos, na projeção missionária que há de ser sempre a nossa.

O Evangelho que ouviremos neste Domingo
ilustra-nos bem como estamos e sobretudo com Quem estamos. No mar deste mundo, na barca da Igreja, nos sobressaltos da navegação e só em Cristo assegurados. 
No mar deste mundo, interior e exterior a cada um de nós, que tanto atrai e extasia como ameaça e interrompe normalidades e expetativas. Assim vogamos, inevitavelmente, e só por engano ou descaso pensaremos o contrário. Nenhum seguro de vida é bastante - pessoal, social ou mesmo eclesial que fosse. Nenhuma garantia humana chegaria, dada a fragilidade essencial das coisas – como a atual crise pandémica mais uma vez manifesta. 
Assim estavam os discípulos naquela barca invadida pelas ondas alterosas. Jesus tinha-os mandado avançar para “a outra margem do lago”, como sempre nos envia para além donde estamos, física ou mentalmente falando. Ia com eles, mas adormecera, deixando-os conduzir a barca. Veio a tempestade e instalou-se o pânico. Clamaram por Ele, que amainou a tempestade e lhes repreendeu a pouca fé.
Dificilmente encontraríamos melhor ilustração do que sempre foi a Igreja de Cristo no mundo, “entre alegrias e esperanças, tristezas e angústias” (Gaudium et Spes, 1) que não faltaram nem faltarão, nossas e alheias. Sobretudo, não tivemos nem mantemos outra razão maior para pacificar o coração, continuar o rumo e servir a todos, do que esta de estar sempre connosco Aquele que nos manda prosseguir. Dá-nos ocasião e responsabilidade para conduzir a barca, mas só Ele garante o destino dela, até à “outra margem” que continuamente nos desafia.

O trecho evangélico também ilustra a situação do Patriarcado no que à evangelização diz respeito
. No caminho sinodal evidenciaram-se as diversas situações que encontramos.
Podemos talvez dizer que a barca da Igreja prossegue normalmente nas comunidades estabelecidas, com a ação pastoral respetiva, da pregação à catequese, dos sacramentos ao acompanhamento espiritual dos fiéis, do acolhimento à caridade pessoal e institucional. 
Mas também o mar se agita e levanta, sempre que verificamos que pouco sobra da antiga fé, quando realmente existiu, e quase só como referência sociocultural de sentido fraco ou alterado. Neste caso, já frequente, é preciso oferecer “com novo ardor, novos métodos e novas expressões” o Evangelho de Cristo e a sua inesgotável capacidade criativa.
Entretanto, temos também agora o desafio do primeiro anúncio, para fazermos aqui o que a antiga missão fez e continua a fazer lá longe, oferecendo Cristo a quem o não conhece. Na verdade, contamos com uma centena de nacionalidades residentes, provindas algumas delas de espaços onde a evangelização não chegou, nem localizou a Igreja. Verificamos no Patriarcado aquela situação já enunciada por São João Paulo II na exortação apostólica pós-sinodal Ecclesia in Europa: «Em várias partes da Europa, há necessidade do primeiro anúncio do Evangelho: aumenta o número de pessoas não batizadas, seja pela consistente presença de imigrantes que pertencem a outras religiões, seja também porque famílias de tradição cristã não batizaram os filhos […]. Com efeito, a Europa faz parte já daqueles espaços tradicionalmente cristãos, onde, para além duma nova evangelização, se requer em determinados casos a primeira evangelização. […] Mesmo no “velho” continente existem extensas áreas sociais e culturais onde se torna necessária uma verdadeira e própria missio ad gentes» (nº 46).

Neste contexto, poderíamos ser tentados a ficar mais por nós
, os crentes, qual último reduto duma falsa segurança; ou a deixarmos crescer o desalento, face a grandes contrastes no campo dos valores e contravalores, por vezes bem longe da moral evangélica. Assim poderia acontecer, mas não sucederá decerto. Não é a primeira vez que em tantos séculos “cristãos” do nosso território a habitualidade eclesial foi interrompida, como naquela tempestade do lago. Entretanto, o essencial resistiu e novos impulsos apareceram, sinais vivos de que o Senhor vai connosco e só com Ele podemos prosseguir. Quando “adormece” é apenas para pôr à prova a nossa fé e abrir espaço para a corresponsabilidade que quer repartir connosco, para a missão de que nos incumbe. 
Assim prosseguiremos como Igreja de Lisboa, cada vez mais polarizados na Jornada Mundial da Juventude, que daqui a dois anos nos trará uma multidão de gente nova, provinda de todo o mundo. O Papa Francisco quer que seja um tempo forte de evangelização, como aliás já está a ser, envolvendo cada vez mais pessoas. Vivamos sempre mais em Evangelho, para o partilharmos depois com tantos que o trarão também. 
Assim nos reforçaram os sete anos sinodais que agora se concluem e projetam para o futuro, na senda missionária que nos define como Igreja de Deus para todos. Sim, há sempre outra margem à nossa espera, em cada geografia territorial, social ou cultural que ao Evangelho se disponha. Com Maria, iremos apressadamente, porque quem ama não demora - É connosco agora, é com Cristo sempre!

 

+ Manuel, Cardeal-Patriarca


Palavras conclusivas do Sínodo Diocesano de Lisboa, I Vésperas do XII Domingo do Tempo Comum, Seminário dos Olivais, 19 de junho de 2021

Patriarcado de Lisboa

17 junho 2021

SOMBRA NO SACRÁRO

 


 

Ontem à noite, quando rezávamos o Terço dos Homens na igreja paroquial da Marinha Grande, reparei na sombra projectada na parede junto ao sacrário.

E nessa sombra, (vista pelos olhos de quem reza), vi um homem de barba, segurando o seu chapéu atrás das costas, ajoelhado em cima de uma árvore e rezando à entrada de uma capela.

Coincidências, dirão alguns, não é mais do que uma sombra sem qualquer significado.

E têm razão, pois não é mais do que uma sombra projectada numa parede, mas a circunstância de ser ao lado do sacrário, de acontecer durante a recitação do terço, de estarmos num ambiente de recolhimento e oração, tudo pode transformar quando acreditamos que Deus está presente em tudo e nos dá sinais, por vezes quase imperceptíveis, da Sua presença.

E ao ler o Evangelho de hoje, chamaram-me a atenção estes versículos: «Quando orardes, não digais muitas palavras, como os pagãos, porque pensam que serão atendidos por falarem muito.

Não sejais como eles, porque o vosso Pai bem sabe do que precisais, antes de vós Lho pedirdes.»

Reparei então que a sombra em causa representa também um silêncio, o silêncio de um homem em recolhimento, prostrado de joelhos, levantando a cara ao Céu, numa súplica humilde, (a sua postura de segurar o chapéu atrás das costas), em cima de uma árvore, (como Zaqueu), à procura de Jesus Cristo que ali passa, pois está no sacrário.

É um milagre, uma visão, um acontecimento místico, sequer?

Claro que não!

É apenas e tão só o Deus que nos fala quando estamos atentos e receptivos a crer que Ele está sempre connosco e que se compraz em dizer ao Homem: “Sei bem do que precisas. Acredita, ama, confia e espera, porque Eu estou sempre convosco!”

Obrigado, Senhor, glória a Ti por toda a eternidade.

 

Marinha Grande, 17 de Junho de 2021

Joaquim Mexia Alves