O presidente da Cáritas Diocesana de Lisboa destaca a importância das
Cáritas Paroquiais, “que estão no terreno e conhecem as realidades e as
pessoas”. Em entrevista ao Jornal VOZ DA VERDADE, por ocasião do Dia
Mundial dos Pobres (15 de novembro), o almirante Luís Macieira Fragoso
sublinha que a pandemia “veio reforçar” a missão destas valências.
A atual direção da Cáritas Diocesana de Lisboa tem feito uma aposta nas Cáritas Paroquiais. Qual a importância destas valências?
A
Cáritas Diocesana deve focar-se na animação e no apoio à ação sócio
caritativa da Igreja, na diocese. Quem, melhor do que ninguém, está no
terreno e conhece as realidades locais são as paróquias. Portanto, não
faz muito sentido a Cáritas Diocesana ter grandes valências, grandes
capacidades, porque há outras entidades que estão no local e que,
supostamente, até conhecem melhor as pessoas, que são quem nós queremos
ajudar. Quando falamos em caridade, não estamos a falar em questões
administrativas, mas em apoio a pessoas, de uma maneira cristã. A nossa
visão é nesse sentido. Aliás, o senhor Patriarca, quando nos deu posse,
fez bastante enfoque nessa questão.
O
que pretendemos com as Cáritas Paroquiais é que, nas paróquias, seja
dinamizada a ação sócio caritativa, e que essa ação não seja uma coisa
de alguns, que fizeram, num determinado momento, alguma coisa e tomaram
uma iniciativa importante, como uma IPSS, um lar, uma creche, mas isso
não esgota o acolhimento, não esgota todas as ações. A caridade tem tudo
o que tem a ver com as pessoas, e é importante alertar as paróquias
para isso. Algumas pensam que, por já terem esse trabalho, está tudo
feito, está resolvido. Não é! Para isso, há o Estado, que funciona assim
e não tem que exercer caridade. Nós, cristãos, queremos fazê-lo e
apoiar os nossos iguais através da caridade.
De que forma isso pode ser feito?
Primeiro,
temos que sensibilizar e formar os grupos. Depois, temos que criar
condições para que esses grupos atuem de forma coerente com a doutrina. E
isso é feito através da formação, não basta ter boa vontade, é preciso
que as pessoas que estão a atuar no terreno estejam preparadas, a nível
eclesiástico, a nível de formação teórica e teológica mínima, para dar
sentido à sua ação e não ser apenas uma reação sentimental que qualquer
pessoa de boa vontade terá. Há também aspetos técnicos, porque quando as
pessoas se confrontam com problemas complicados, e infelizmente a
realidade humana é assim, há muitas pessoas que estão em situação de
pobreza absoluta e alguns transformam-se em profissionais da pobreza. O
que nós queremos é que as pessoas não sejam pobres, e saiam dessa
situação que é uma indignidade. Tudo isto faz parte de um pacote de
formação, que permanentemente estamos a ministrar.
Considera que a pandemia veio reforçar a importância das Cáritas Paroquiais?
Nós
tínhamos o combate à fome bastante controlado, por um conjunto de
iniciativas que foram tomadas, em tempo, e de repente, com esta pandemia
e com todos os problemas sociais que vieram daí, irrompeu um problema
gravíssimo de fome. Portanto, essa é a primeira emergência: garantir a
sobrevivência das pessoas. Claro que há muitas coisas para fazer e aí,
as paróquias, uma vez mais, estarão sempre na primeira linha. Há muitas
instituições católicas que estão no terreno a fazer coisas
importantíssimas, mas as paróquias são o elo de ligação dos católicos a
toda a estrutura. Quando há uma emergência, como é o caso, isso vem dar,
ainda, mais força a esta rede – se nós pertencermos a uma rede, estamos
mais à vontade para responder, em tempo e com resposta adequada, aos
problemas e às necessidades das pessoas.
Têm-vos chegado ecos das Cáritas Paroquiais sobre as dificuldades que têm sentido?
Todos
os dias recebemos pedidos, através das paróquias, para apoios a
famílias, uma vez que elas já não têm condições e capacidade para dar
essa resposta. E são problemas desde a alimentação, até às rendas, às
despesas de habitação, aquelas coisas do dia-a-dia… Porque há muitos
casos de pessoas que nunca pensaram em ser pobres e que de repente, de
um dia para o outro, ficaram pobres, por força desta situação
inesperada. Ficaram sem rendimento nenhum, e são pessoas altamente
capazes, e é importantíssimo que rapidamente sejam reintegradas na vida
normal da sociedade.
Atrás
disto vêm outros problemas que nos preocupam, que são os centros sociais
paroquiais, que fruto desta crise têm uma quebra importante de
receitas, tal como as paróquias, que se estão a ressentir disso. É muito
importante que as IPSS’s não deixem de cumprir a sua missão, porque
senão, no território do Patriarcado, seria uma grande desgraça.
No universo das 285 paróquias da diocese haverá muito para crescer em termos de Cáritas Paroquiais…
Temos
um enorme espaço para crescer. Infelizmente, a percentagem que temos de
Cáritas Paroquiais é diminuta. Já crescemos alguma coisa nos últimos
dois anos, neste momento estamos no processo de criação de seis novas
Cáritas Paroquiais – sendo que duas estão já a entrar –, mas é um
desafio, porque à medida que se vão concretizando estas Cáritas
Paroquiais também nós temos que responder a esse desafio, porque é um
aumento significativo e a tal rede precisa de quem faça os nós. Se
funcionarmos em rede, há paróquias que estão bem financeiramente, têm
condições, e paróquias ao lado que, se calhar, estão mal e é possível
ajudar. Isso dá um sentimento de comunidade. Nós somos membros da mesma
Igreja e a tal rede pode ajudar a criar esta visão.
Na manhã de 7 de novembro, a Cáritas de Lisboa reuniu com todas as Cáritas Paroquiais. Que importância têm estes momentos?
Fazemos
duas reuniões por ano com as Cáritas Paroquiais, com dois objetivos
fundamentais: continuar a passar informação, explicando a nossa missão,
para as pessoas não se desfocarem; e criar este sentimento de grupo, de
que todos somos parte do mesmo. Ao mesmo tempo, partilha-se uma coisa
importantíssima, que são as experiências, o darem a conhecer o que estão
a fazer, as realidades que têm, porque a realidade das paróquias da
Grande Lisboa pouco tem a ver com a realidade do Oeste.
Na
primeira carta que escreveu ao clero de Lisboa, quando tomou posse, em
abril de 2018, garantiu que tudo iria fazer para “ajudar com eficiência e
eficácia os que necessitam de apoio”. Que caminho tem sido possível
realizar por estes órgãos sociais?
O
balanço é positivo. Claro que queremos que as coisas avancem muito mais
depressa, mas a verdade é que nós sentíamos, quando chegámos, que havia
uma certa incompreensão recíproca entre a Cáritas Diocesana e as
paróquias, concretamente os párocos. Uns porque questionavam para o que
servíamos e diziam não saber nada do que acontecia; do lado de cá,
dizia-se que os párocos não ouvem, não ligam aos e-mails e não dão
respostas. Esse foi o caminho difícil que se foi fazendo. Nós somos
todos pessoas e, portanto, é preciso falar com elas diretamente,
explicar. Isto demora tempo, mas as experiências que se vão tendo no
terreno iluminam o caminho para outras e as coisas estão,
progressivamente, a ser mais dinâmicas.
Que significado teve a criação, em 2017, do Dia Mundial dos Pobres, pelo Papa Francisco, que a Igreja assinala neste Domingo?
Para
nós, é muito importante, porque é para os pobres que trabalhamos.
Pessoalmente, não gosto muito de falar em pobres, porque atrás disso
normalmente vem um estigma – gosto mais de falar em pessoas que estão
carentes e precisam de apoio. De qualquer maneira, é positivo tudo o que
sejam iniciativas que nos lembrem a importância de olhar para os outros
e de criar condições para os apoiarmos. Nós não queremos que as pessoas
fiquem pobres. O assistencialismo não é a nossa linha de ação, porque
só resolve no momento, mas o problema subsiste. Sobretudo, é um problema
de dignidade. O que queremos é devolver às pessoas condições para que
possam aceder a um mínimo de condições de vida. Esta é uma luta
permanente e nós temos que olhar para o nosso próximo e fazer com que
ele tenha uma vida digna.
- Leia o artigo completo na edição do dia 15 de novembro do Jornal VOZ DA VERDADE, disponível nas paróquias ou em sua casa.
Patriarcado de Lisboa
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