Mariangela Jaguraba - Vatican News
O Papa Francisco presidiu a missa, neste domingo (07/07), na Piazza Unità d'Italia, no âmbito da sua visita pastoral a Trieste para a conclusão da 50ª Semana Social dos Católicos em Itália.
"Para despertar a esperança dos corações aflitos e apoiar os esforços do caminho, Deus suscitou sempre profetas entre o seu povo", disse o Pontífice no início da sua homilia. Muitas vezes os profetas encontraram um povo rebelde e foram rejeitados, mas Jesus também tem a mesma experiência dos profetas. "Retorna a Nazaré, a sua pátria e entre as pessoas com as quais cresceu, mas não é reconhecido". Ele «era motivo de escândalo para eles», conforme diz o Capítulo 6° do Evangelho de Marcos.
O Papa disse que "a palavra 'escândalo' não se refere a algo obsceno ou indecente como a usamos hoje; escândalo significa 'uma pedra de tropeço', ou seja, um obstáculo, um impedimento, algo que bloqueia e impede de ir adiante". As pessoas não conseguem entender "como do filho de José, o carpinteiro, ou seja, de uma pessoa comum, poderia surgir tanta sabedoria e até mesmo a capacidade de realizar prodígios. O escândalo, então, é a humanidade de Jesus. O obstáculo que impede estas pessoas de reconhecer a presença de Deus em Jesus é o facto de que Ele é humano, é simplesmente o filho de José, o carpinteiro".
"Este é o escândalo: uma fé fundada num Deus humano, que se inclina para a humanidade, que cuida dela, que se comove com as nossas feridas, que toma sobre si o nosso cansaço, que se parte como pão para nós", sublinhou o Papa, acrescentando que "um Deus forte e poderoso, que está do meu lado e satisfaz-me em tudo, é atraente; um Deus fraco, que morre na cruz por amor e também me pede para vencer todo o egoísmo e oferecer a vida pela salvação do mundo, é um Deus incómodo".
Mas, colocando-nos diante do Senhor Jesus e olhando para os desafios que nos interpelam, para os muitos problemas sociais e políticos também discutidos nesta Semana Social, para a vida concreta da nossa gente e dos seus esforços, podemos dizer que hoje precisamos exatamente disto: do escândalo da fé. Não de uma religiosidade fechada em si mesma, que ergue o olhar para o céu sem se preocupar com o que acontece na terra e celebra liturgias no templo esquecendo-se da poeira que corre pelas nossas estradas.
"Precisamos do escândalo da fé", disse ainda Francisco, "de uma fé arraigada no Deus que se fez homem e, portanto, de uma fé humana, de uma fé de carne, que entra na história, que acaricia a vida das pessoas, que cura os corações partidos, que se torna fermento de esperança e germe de um mundo novo".
É uma fé que desperta as consciências do torpor, que põe o dedo nas feridas da sociedade, que levanta questões sobre o futuro do homem e da história; é uma fé inquieta, uma fé que se move de coração a coração, uma fé que acolhe os problemas da sociedade, uma fé que nos ajuda a vencer a mediocridade e a acídia do coração, que se torna um espinho na carne de uma sociedade muitas vezes anestesiada e atordoada pelo consumismo.
A este propósito, o Papa perguntou: "Já pensaram se o consumismo entrou nos vossos corações? Aquela ânsia de ter, de ter coisas e ter mais. Aquela ânsia de desperdiçar dinheiro. O consumismo é uma chaga. É um cancro que adoece o coração, que torna a pessoa egoísta, que faz a pessoa olhar apenas para si mesma".
Irmãos e irmãs, precisamos de uma fé que dispersa os cálculos do egoísmo humano, que denuncia o mal, que aponta o dedo contra as injustiças, que perturba as tramas de quem, na sombra do poder, brinca com a pele dos fracos. E quantos usam a fé para explorar as pessoas. Isto não é fé.
A seguir, o Papa disse que não nos devemos esquecer de que "Deus esconde-se nos cantos escuros da vida e das nossas cidades. A sua presença revela-se precisamente nos rostos escavados pelo sofrimento e onde a degradação parece triunfar".
O infinito de Deus está escondido na miséria humana, o Senhor agita-se e torna-se presença amiga precisamente na carne ferida dos últimos, dos esquecidos e dos descartados. Ali, Deus manifesta-se. E nós, que às vezes escandalizamo-nos inutilmente com muitas pequenas coisas, faríamos bem em nos quesytionar: por que não nos escandalizamos diante do mal que se espalha, da vida humilhada, dos problemas do trabalho, do sofrimento dos migrantes? Por que permanecemos apáticos e indiferentes diante das injustiças do mundo? Por que não levamos a sério a situação dos encarcerados, que também desta cidade de Trieste se eleva como um grito de angústia? Por que não contemplamos a miséria, a dor, o descarte de tantas pessoas da cidade? Temos medo. Temos medo de encontrar Cristo ali.
"Jesus viveu na sua própria carne a profecia do quotidiano, entrando na vida e nas histórias diárias do povo, manifestando a compaixão nas vicissitudes humanas. Ele manifestou o ser de Deus que é compassivo. Ele permaneceu fiel à sua missão, não se escondeu atrás da ambiguidade, não aceitou a lógica do poder político e religioso. Fez da sua vida uma oferta de amor ao Pai. Assim também nós, cristãos: somos chamados a ser profetas e testemunhas do Reino de Deus, em todas as situações que vivemos, em todos os lugares em que vivemos", disse ainda o Papa.
Desta cidade de Trieste, com vista para a Europa, encruzilhada de povos e culturas, terra de fronteira, alimentemos o sonho de uma nova civilização fundada na paz e na fraternidade; não nos escandalizemos com Jesus, mas, pelo contrário, indignemo-nos com todas aquelas situações em que a vida é brutalizada, ferida e morta; levemos a profecia do Evangelho na nossa carne, com as nossas escolhas antes mesmo das palavras. Com a coerência entre escolhas e palavras.
Francisco concluiu, incentivando a Igreja em Trieste a continuar "a trabalhar na linha de frente para difundir o Evangelho da esperança, especialmente para aqueles que chegam da rota dos Balcãs e para todos aqueles que, no corpo ou no espírito, precisam de ser encorajados e consolados. Empenhemo-nos juntos: para que, redescobrindo-nos amados pelo Pai, possamos todos viver como irmãos. Todos irmãos, com o sorriso do acolhimento e da paz na alma".
VN
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