Pe. Benedict Mayaki, SJ/Mariangela Jaguraba
O secretário Vaticano para as relações com os Estados, dom Paul Richard Gallagher, convidou as Nações Unidas a “redescobrir o fundamento dos direitos humanos a fim de os implementá de maneira autêntica”, já que o mundo continua a tomar medidas para combater a emergência sanitária em andamento.
Dom Gallagher fez este apelo numa mensagem de vídeo durante a 46ª sessão do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas (UNHRC), que começou na segunda-feira (22/02), em Genebra, na Suíça. A sessão de quatro semanas, que está a ser realizada em modo virtual devido à emergência de saúde em andamento, começa com um segmento de alto nível de três dias no qual chefes de Estado e dignitários que representam vários países e regiões dirigir-se-ão ao Conselho através de vídeo.
Por mais de um ano, observou dom Gallagher, “a pandemia da Covid-19 impactou todos os aspetos da vida, causando a perda de muitas e colocando em dúvida os nossos sistemas económico, social e de saúde”. Ao mesmo tempo, “colocou em discussão o nosso compromisso com a proteção e a promoção dos direitos humanos universais, afirmando ao mesmo tempo a sua relevância”. Recordando as palavras do Papa Francisco na sua última Encíclica “Fratelli tutti”, dom Gallagher sublinhou a sua relevância para o nosso tempo, observando que “reconhecendo a dignidade de cada pessoa humana, podemos contribuir para o renascimento de uma aspiração universal à fraternidade”.
Os direitos humanos são incondicionais
O prelado salientou que a Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH) declara que “o reconhecimento da dignidade intrínseca de todos os membros da família humana e dos seus direitos iguais e inalienáveis constitui o fundamento da liberdade, da justiça e da paz”. Ao mesmo tempo, a Carta das Nações Unidas afirma a sua confiança no “fundamental dos direitos humanos, na dignidade e no valor da pessoa humana, na igualdade de direitos de homens e mulheres e das nações grandes e pequenas”. Dom Gallagher enfatizou que estes dois documentos reconhecem uma verdade objetiva: que toda pessoa humana é inata e universalmente dotada de dignidade humana. Esta verdade, “não é condicionada pelo tempo, lugar, cultura ou contexto”, ressaltou. Reconhecendo que este compromisso solene “é mais fácil de pronunciar do que de alcançar e colocar em prática”, lamentou que estes objetivos estão “ainda longe de serem reconhecidos, respeitados, protegidos e promovidos em todas as situações”.
Os direitos não são separados dos valores universais
O arcebispo Gallagher prosseguiu dizendo que a verdadeira promoção dos direitos humanos fundamentais depende dos fundamentos dos quais eles derivam. Portanto, ele advertiu que qualquer prática ou sistema que trate os direitos de forma abstrata, separado dos valores pré-existentes e universais, corre o risco de minar a sua razão de ser, e em tal contexto, as instituições de direitos humanos tornam-se suscetíveis às “modas, visões ou ideologias prevalecentes”.
O prelado também advertiu que em tal contexto de direitos sem valor, os sistemas podem impor obrigações ou sanções que nunca foram previstas pelo Estado, que podem contradizer os valores que eles deveriam promover. Ele acrescentou que eles também podem “presumir criar os chamados 'novos' direitos que carecem de um fundamento objetivo, distanciando-se do seu propósito de servir à dignidade humana”.
O direito à vida
Ilustrando a inseparabilidade dos direitos dos valores com o exemplo do direito à vida, dom Gallagher aplaudiu o facto do seu conteúdo ter sido “progressivamente ampliado, combatendo atos de tortura, desaparecimentos forçados e pena de morte; e protegendo os idosos, migrantes, crianças e a maternidade”. Ele disse que estes desenvolvimentos são extensões racionais do direito à vida porque mantêm a sua base fundamental no bem intrínseco da vida, e também porque “a vida, antes de ser um direito, é antes de tudo um bem a ser amado e protegido”.
Medidas Covid-19 e direitos humanos
O arcebispo prosseguiu salientando que, diante da atual pandemia da Covid-19, algumas medidas implementadas pelas autoridades públicas para garantir a saúde pública dificultaram o livre exercício dos direitos humanos. Ressaltando que “qualquer solução para o exercício dos direitos humanos para a proteção da saúde pública deve derivar da uma situação de estrita necessidade”, ele observou que “um certo número de pessoas, encontrando-se em situações de vulnerabilidade, tais como idosos, migrantes, refugiados, indígenas, deslocados internos e crianças, foram desproporcionalmente afetados pela crise atual”. Tais mudanças, insistiu ele, “devem ser proporcionais à situação, aplicadas de forma não discriminatória e utilizadas somente quando outros meios não estiverem disponíveis”.
Liberdade de religião
O arcebispo Gallagher também reiterou a urgência de proteger o direito à liberdade de pensamento, consciência e religião, observando em particular que “a crença religiosa e a sua expressão estão no cerne da dignidade da pessoa humana em sua consciência”. Salientando que a resposta global à pandemia da Covid-19 revela que “esta sólida compreensão da liberdade religiosa foi corroída”, o arcebispo reiterou a ênfase da Santa Sé, reconhecida por vários instrumentos de direitos humanos, de que “a liberdade de religião também protege o seu testemunho público e expressão, tanto individual como coletivamente, pública e privada, em formas de culto, observância e ensino”. Para respeitar o valor intrínseco deste direito, o arcebispo recomendou que as autoridades políticas se envolvam com líderes religiosos, organizações religiosas e líderes da sociedade civil comprometidos com a promoção da liberdade de religião e consciência.
Fraternidade humana, multilateralismo
Dom Gallagher observou que a crise atual oferece-nos uma oportunidade única para nos aproximar do multilateralismo “como expressão de um renovado senso de responsabilidade global, solidariedade baseada na justiça e na conquista da paz e da unidade dentro da família humana, que é o plano de Deus para o mundo”.
VN
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