Cardeal-Patriarca de Lisboa presidiu à Missa Exequial do ensaísta português.
A visão abrangente que Eduardo Lourenço tinha sobre Portugal ajudou os portugueses a mudarem a perspetiva sobre si próprios, diz D. Manuel Clemente à Renascença no dia em que se realizou o funeral do ensaísta. “Eduardo Lourenço deixa-nos um legado grande de quase um século de vida – vivida, convivida, pensada e que foi compartilhando connosco, olhando-nos a nós, portugueses, no contexto mundial, fazendo-nos ultrapassar limitações mentais que tínhamos posto a nós próprios”, afirma. E fê-lo “analisando-nos no passado, no presente e projetando-nos no futuro em termos portugueses, europeus, mundiais”, acrescentou.
Aos jornalistas, D. Manuel Clemente frisou ainda a “inquietação” sobre Deus que Eduardo Lourenço “transportou durante toda a sua vida”. “É um homem que levou sempre consigo uma inquietação que trouxe da infância, que é uma inquietação religiosa, no sentido de se procurar, não só o que os outros esperam dele, mas o que o próprio Deus espera. Essa inquietação, que transportou durante toda a sua vida, aparece muito nas suas páginas, digo, por presença ou desejo. Daí que revisitar Eduardo Lourenço, como agora o revisitamos em Deus, é um bem para todos”, aponta o Cardeal-Patriarca, enaltecendo a paz com que o ensaísta viveu os últimos dias. “Faleceu agora, em paz, na unidade de cuidados paliativos que o assistiu nos últimos tempos e também nos deixa em paz, porque uma vida assim resolvida também nos ajuda a resolver a todos”, conclui.
Também em declarações à Renascença, o Cardeal D. José Tolentino Mendonça salienta a “situação inédita esta que vivemos”, a propósito da morte de Eduardo Lourenço. “Quando morria alguém com uma dimensão pública e cultural em Portugal, a pessoa que íamos escutar era exatamente o Professor Eduardo Lourenço e hoje, que é o dia da partida dele, nós perguntamos a nós próprios quem era Eduardo Lourenço e o que é que ele nos deixa”, sustenta.
“A ideia que ele mais perseguiu, mais trabalhou, pensando Portugal, a literatura portuguesa, a política portuguesa, os traumas portugueses – porque também fez a psicanálise de Portugal – foi o da comunidade”, diz José Tolentino Mendonça. Eduardo Lourenço mostrava “a interligação profunda” existente no país, “falando de Portugal como de uma experiência espiritual. E isso é um legado e uma responsabilidade para todos nós”, refere o conselheiro do Papa. “Faz-nos muita falta essa visão integradora e um olhar para Portugal como uma realidade coesa e como um país com um projeto que não se esgota no imediato, mas, como ele dizia, que é uma espécie de destino”, concretiza.
No dia de ontem, em reação ao falecimento de Eduardo Lourenço, a Conferência Episcopal Portuguesa (CEP), através da Comissão da Cultura, Bens Culturais e Comunicações Sociais, prestou homenagem ao ensaísta. “A Igreja Católica reconhece o valor de Eduardo Lourenço por ser um homem de questionamento, um homem que colocou toda a sua vida ao serviço do bem comum pelo seu próprio pensamento, questionando e abordando os grandes temas da humanidade como o sentido da vida e o sentido da história”, disse o presidente da comissão D. João Lavrador à Agência Ecclesia, no dia de ontem, após o conhecimento do falecimento de Eduardo Lourenço, aos 97 anos.
O Bispo de Angra lembrou ainda a figura incontornável da cultura portuguesa que tinha sido agraciada recentemente pela Igreja com o prémio de cultura ‘Árvore da Vida – Padre Manuel Antunes’. Os muitos anos vividos por Eduardo Lourenço “não apagam a dor e a falta de um homem, que marcou a história do pensamento, da nação portuguesa e mesmo no plano internacional”, afirmou.
Com Renascença e Ecclesia
Foto: Tiago Miranda/Expresso
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